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Fashionista


Verão 2001

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nas ruas


Alexandre
Herchcovitch


Moeda do luxo



 


O estilista faz três desfiles no MorumbiFashion, estréia em Paris, lança livros, jóias, roupa de ginástica e lingerie

Herchcovitch?

Divulgação
Geanini Marques em
triquíni, em 98

DA REDAÇÃO

Alexandre Herchcovitch pode ser um bom emblema para o atual momento da jovem e ambiciosa moda brasileira. Aos 28 anos, ele se prepara para estrear no circuito do Prêt-à-Porter de Paris, em outubro. É a mais selvagem arena da moda, com intensa competição entre criadores de toda parte do planeta por um pouco de atenção da mídia _ambiente em que Ocimar Versolato foi o primeiro brasileiro a ingressar.

Estilista desde 93, Herchcovitch tenta carreira internacional há quatro anos. omeçou por Nova York, batendo na porta de lojas com suas roupas numa mochila, sem conhecer ninguém. Fez a mesma coisa em Londres e conseguiu entrar na semana oficial inglesa, a London Fashion Week. Aos poucos colocou suas peças nas revistas de moda e, agora, para entrar na rota da grande mídia, segue para Paris.

Em Paris, Londres e São Paulo, em outubro, Herchcovitch lança pela Cosac & Naif um livro fotográfico sobre seu trabalho, em três edições (francês, inglês e português).

“Quis fazer um registro. Aqui no Brasil as pessoas têm memória falha. Você faz uma coisa antes, mas o mérito é do outro. Eu já superei isso”, explica o estilista.

Herchcovitch desenha também o segmento feminino da Zoomp, uma linha de lingerie e bodies para a Puket (quatro minicoleções ao ano), coleções de roupas de ginástica (duas ao ano) para a academia Biorritmo e faz pesquisa de matéria-prima para a tecelagem Vicunha. Seu próximo passo será uma linha de jóias. “Não posso aceitar mais nada, acabou meu tempo”, diz.

Em meio aos preparativos para seus dois desfiles no MorumbiFashion Brasil, dias 28 de junho e 4 de julho, mais o da Zoomp, dia 30 de junho, Herchcovitch recebeu a <BF>Folha<XB> em seu ateliê/loja na rua Haddock Lobo (no bairro dos Jardins, em São Paulo), onde quis ser fotografado com uma cabeça de porco de pelúcia.
(ERIKA PALOMINO)

*

Folha - Você estava desfilando em Londres, agora é Paris.
Alexandre Herchcovitch - Londres é legal, mas a mídia era apenas a de Londres. A maioria dos veículos não vai ou manda o assistente. Nunca a pessoa certa ia. Então tive pessoalmente uma reunião com Didier Grumbach (presidente da Chambre Syndicale du Prêt-à-Porter) e fui imediatamente aceito. Agora estou com uma nova assessoria em Paris, o Girault-Totem, que está em fase de reestruturação e quer crescer.
Folha - Qual era sua expectativa quando você entrou em Londres e qual é a de agora?
Herchcovitch - O desfile é o ápice de minha expressão. Do jeito que quero mostrar minha moda, preciso fazer desfile. Mas Londres teve esse problema. Em Paris pretendo vender mais e quero que dêem valor ao meu trabalho.
Folha - Quem banca sua carreira internacional, já que custa caro desfilar fora do Brasil e lá não existe o paternalismo dos eventos daqui... (os estilistas recebem ajuda de custo para modelos, maquiagem, trilha sonora e o espaço é gratuito)
Herchcovitch - É bastante caro. Não existe no mundo esquema como o daqui. Então se gastou muito até agora. Para quem pensa que é fácil, eu digo: é complicado. Por exemplo, é preciso fazer um mostruário a mais, e isso significa, no meu caso, 500 peças a mais.
Folha - É a Zoomp quem paga?
Herchcovitch - A Zoomp licencia e comercializa o jeanswear Alexandre Herchcovitch. Eu fico com o prêt-à-porter, o ateliê. Então eles entram como patrocinadores, para eles é um investimento de imagem.
Folha - Você ficou rico?
Herchcovitch - Não fiquei rico. Eu diria que 95% do que ganho aplico aqui dentro. Rico nunca. Estou com um monte de trabalho que reverto para cá. Considero que esses dez primeiros anos serão de investimento na marca. Daí quero aumentar, estabilizar. Tem sido uma grande luta. Somente de três coleções para cá as pessoas estão realmente comprando minha roupa. Vendo em 70 pontos-de-venda. A marca é sofisticada, mas há uma preocupação com o lado comercial, e assim a profissionalização se completa. Eu quero atender as pessoas sem perder minha linguagem. Eu fiz as pessoas entenderem meu trabalho.
Folha - Você está falando de metas, de planejamento. Parece bem organizado. É instintivo ou tem alguém fazendo isso para você?
Herchcovitch - Continuo com as mesmas oito pessoas do começo, o que inclui minha mãe, meu irmão e o Maurício Ianês. Foi meio forçado, aprendemos juntos. Mas eu até quero contratar uma pessoa para isso, não podemos ter furo. Na última temporada, nossa entrega foi de quase 100%. Mas não quero ser grande como a Zoomp, nem teria produto.
Folha - Quão grande então você quer ser?
Herchcovitch - Ter mais uma loja ou duas em São Paulo, mais três em outros Estados. Mas isso daqui a uns sete, dez anos... E vender mais lá fora, porque lá é outra realidade. Eles compram superpouco, às vezes apenas cinco peças. Um pedido grande fora do Brasil é de cem peças. Em Curitiba, uma única loja chega a comprar de mim mil peças. Lá (no exterior) você compete com centenas de marcas. Não é o paraíso e não se faz dinheiro lá fora.
Folha - O que você acha do atual momento da moda brasileira?
Herchcovitch - Tem gente que fala para mim: “Aproveita que agora vêm os jornalistas internacionais e faz biquíni”. Bem, meu trabalho não mudou porque agora vem gente ver. Os trabalhos têm de ser universais. Quem fizer moda regional vai morrer em duas coleções. O que vai prevalecer são os trabalhos com personalidade. Essa coisa de achar que os jornalistas de fora querem ver moda praia agora é um equívoco, uma armadilha. Por exemplo, se no seu trabalho sempre teve isso, tudo bem.
No caso do Lino Villaventura, se as pessoas vierem buscar o regional, então é o momento dele, porque ele sempre fez isso, então ele está muito coerente com isso. Por acaso, nesta temporada, não vou fazer maiô. É a única coisa que posso adiantar sobre a coleção. Se não, está na cara que é “pra inglês ver”. Tudo bem, você pode até se esmerar, mas mudar seu estilo, não. Outra coisa: todas as trilhas vão ter bossa nova! Então por que não fez antes?
Folha - Você avalia que há alguma característica brasileira, algum denominador entre os estilistas nascidos no Brasil?
Herchcovitch - O jeito como revelamos o corpo. Não no meu caso, já que às vezes mostro e outras não; minha característica é negar o que fiz e voltar a fazer. Outra seria o jeito como o brasileiro tem de pegar as tendências. É um jeito muito brasileiro de copiar. Copiar não é coisa só de brasileiro. O brasileiro se inspira na mesma década que a Prada, os anos 40, mas faz então os anos 40 do Brasil. O discurso é esse. Está na hora de acreditar no que já foi comprovado, no que já está certo. Tem empresas grandes de moda que poderiam lançar o que quisessem, mas não. O Brasil está sendo visto, e agora? Vão mostrar cópias deles? As pessoas têm de ter mais coragem.


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