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Fashionista


Verão 2001

Modas de Mulher

Entrevista

Chapeleiro

Cultura fashion
nas ruas


Alexandre
Herchcovitch


Moeda do luxo


 
Autor deixa bem clara a tendência nacional pela sensualidade


Vitalidade, alegria e prazer


CARLOS HEITOR CONY
COLUNISTA DA FOLHA

Poucos autores brasileiros, talvez mesmo o único, com prestígio internacional e acadêmico assegurado, tiveram a obsessão de estudar tão fanaticamente o comportamento humano, no plano individual e no social, como Gilberto Freyre, cujo centenário estamos comemorando.

E foi sem dúvida o primeiro a adotar, como fonte primária de suas pesquisas, os anúncios de jornais e revistas, dando-lhes o crédito de um testemunho mais importante do que os relatos orais ou escritos _que formam a base tradicional dos especialistas...

Usando esse tipo de informação em sua obra-mestra, “Casa-Grande & Senzala”, evidente que ele estaria em seu leito natural ao escrever “Modos de Homem & Modas de Mulher”, livro de 1986, mas decorrente de estudos e notações do autor ao longo de 86 anos.

Temos, então, fundamentada pela experiência de Gilberto Freyre em lidar com os usos e costumes de nossa sociedade, a análise mais abrangente do processo nacional de expressar-se, seja por meio da moda, seja por meio do modo de caminhar pelo mundo.

Não sendo, obviamente, um entendido em moda no sentido profissional, Gilberto Freyre comenta os conceitos e preconceitos que fazem homens e mulheres se apresentarem dessa ou daquela maneira, nesse ou naquele ambiente. São conhecidas suas mágicas fórmulas de penetrar no campo que estuda.

Apoiado em sólida cultura sociológica, ele a distribui de forma coloquial pelas inúmeras manifestações da moda e do modo, incluindo desde a cor da pele bronzeada e tropicalizante ao balanço lascivo da rede de dormir e amar, as protuberâncias de carne que marcam a nossa raça, a ginga no andar, o inexorável apelo da nudez que em menos de cem anos levou a mulher a abandonar o espartilho e a saia-balão para adotar a moda que valoriza a exuberância de seu corpo.

Fanático pelo Brasil, Gilberto Freyre sempre valorizou aspectos que outros acadêmicos desdenham. Foi acusado de pitoresco, de exaltar o colonialismo, de absolver nossa indolência e de considerar nossa concupiscência um valor cultural.

O tempo sempre lhe deu razão. Basta lembrar uma passagem do livro em que ele constata que, sociedade compactamente importadora no passado, a partir dos meados do século 20, começamos a exportar modas e modos para o resto do mundo.

Dotado de uma visão sensual sobre o Brasil, nota-se a alegria com que Gilberto Freyre condena a mulher (e até mesmo o homem) que, seguindo padrões internacionais, fixou-se num tipo de “tábua de passar roupa”, espécimes retilíneos, cabides de carne para costureiros visualmente sofisticados, mas sem o tempero do sexo.

O autor de “Modos de Homem & Modas de Mulher” deixa bem clara a tendência nacional pela sensualidade, pelas formas acentuadas, pela luxúria do banho diário que não herdamos dos orientais, mas de nossas índias nuas nos rios sombreados pelas matas perfumadas do trópico.

Inseparável do modo, a moda para nós não é apenas um objeto de luxo ou ostentação. Na opinião de Gilberto Freyre, é antes de tudo uma expressão de vitalidade, alegria e prazer.


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