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OPINIÃO ECONÔMICA
Valorizem o real!
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
Decididamente, um economista não pode tirar férias sossegado. Volto depois de um mês fora
e encontro o país virado de ponta-cabeça. Aconteceu o que se
temia: um colapso cambial de
consequências graves, que compromete a autonomia da nação
e as suas possibilidades de desenvolvimento.
A mudança cambial em janeiro foi conduzida de forma muito
confusa. Não se faz omelete sem
quebrar ovos, mas o pessoal conseguiu quebrar também a panela, o fogão e ameaça tocar fogo
na cozinha.
São muitas as incertezas, mas
uma coisa é certa: a desvalorização do real foi longe demais.
Passamos de um extremo a outro. Depois de anos de sobrevalorização, temos agora um quadro de subvalorização do real. A
persistência dessa subvalorização, associada à excessiva volatilidade da taxa cambial, ameaça trazer de volta a inflação e
desorganizar a economia como
um todo.
O governo não tem muito tempo para virar o jogo. O Banco
Central precisa reunir logo as
condições para assegurar uma
certa estabilização do preço do
dólar em nível significativamente inferior ao atual. Que
preço seria esse? Depende, entre
outras coisas, do nível interno
de preços e salários pós-desvalorização, mas possivelmente algo
na faixa de R$ 1,60 a R$ 1,70.
É uma ilusão imaginar que isso possa ser alcançado apenas
com medidas monetárias e fiscais. Flutuação cambial pura
não é para o nosso bico. Para o
Brasil, sobretudo agora, o regime mais apropriado é a flutuação administrada, isto é, com
forte intervenção do Banco Central, apoio financeiro externo e
controle dos fluxos cambiais.
Evidentemente, há aspectos
positivos no que aconteceu desde meados de janeiro. Primeiro,
o Brasil abandonou a malfadada âncora cambial bem antes de
esgotar as suas reservas internacionais. Segundo, a desvalorização real do câmbio produzirá,
com alguma defasagem no tempo, substancial melhora na balança comercial e em outras
contas do balanço de pagamentos em transações correntes, reduzindo a nossa dependência
em relação a capitais externos.
Terceiro, caminhamos, ainda
que de forma tumultuada, para
um regime cambial flexível,
mais adequado às circunstâncias internacionais e às características estruturais da economia
brasileira.
Trata-se agora de impedir que
a depreciação e a volatilidade
excessivas da taxa de câmbio
desarrumem de vez uma economia fragilizada por anos seguidos de políticas econômicas inconsistentes e pela turbulência
dos mercados financeiros internacionais.
A consolidação do novo regime cambial pressupõe diversas
ações nos campos interno e externo. Por exemplo: em algum
momento, o Banco Central precisa parar de se comportar como
se estivesse sem reservas. Isso
significa atuar no sentido de
aplainar as flutuações da taxa
cambial e inverter a sua tendência à depreciação.
O importante, nesse momento,
é evitar que se cristalize a percepção de que flutuação significa uma tendência mais ou menos contínua de depreciação. No
momento adequado, o Banco
Central terá que intervir de forma decidida para derrubar e depois estabilizar o preço da moeda estrangeira.
Nas condições atuais, o apoio
financeiro internacional é crucial. O Brasil não pode, porém,
limitar-se a entendimentos com
o FMI e os EUA. Cabe negociar
também com os europeus e japoneses, que têm interesses comerciais e financeiros e investimentos diretos muito expressivos no
Brasil.
É necessário, evidentemente,
assegurar a liberação das parcelas previstas no pacote financeiro de US$ 41 bilhões. Mas, a essa
altura, parece indispensável negociar uma contribuição dos
credores externos privados, que
ficaram de fora do pacote costurado no ano passado. Essa contribuição deve incluir, no mínimo, um compromisso formal
com a recomposição e a sustentação das linhas comerciais e interbancárias de curto prazo.
Sem uma ação mais decidida
do Banco Central e sem apoio
externo, caminharemos para
uma crise que a ninguém interessa.
Paulo Nogueira Batista Jr., 43, economista e
professor da Fundação Getúlio Vargas, escreve às quintas-feiras nesta coluna. E-mail: pnbjr@ibm.net
A coluna de
Aloysio Biondi passa a ser publicada aos sábados. Rubens Ricupero, que escrevia aos sábados, passa a assinar sua coluna
aos domingos.
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