>> Matéria Anterior:
     Bezerra de Menezes
>> Próxima Matéria:
     Avenida Central

REVOLTA DA VACINA
Ano: 1904

"O governo arma-se desde agora para o golpe decisivo que pretende desferir contra os direitos e liberdades dos cidadãos deste país. A vacinação e revacinação vão ser lei dentro em breve, não obstante o clmamor levandado de todos os pontos e que foi ecoar na Câmara dos Deputados através de diversas representações assinadas por milhares de pessoas.

De posse desta clava, que o incondicionalismo bajulador e mesureiro preparou, vai o governo do Sr. Rodrigues Alves saber se o povo brasileiro já se acanalhou ao ponto de abrir as portas do lar à violência ou se conserva ainda as tradições de brio e de dignidade com que, da monarquia democrática passou a esta República de iniqüidade e privilégios.

O atentado planejado alveja o que de mais sagrado contém o patrimônio de cada cidadão: pretende se esmagar a liberdade individual sob a força bruta..." - Correio da Manhã, 7 de outubro de 1904.

"Foi extrema a indignação que o projeto do regulamento da vacina obrigatória excitou no ânimo de todos os habitantes de Rio de Janeiro, cuja sensibilidade ainda não embotaram interesses dependentes do governo e da administração sanitária."

"Durante o dia de ontem foram distribuídos boletins convocando o povo para um meeeting no largo de S. Francisco de Paula, contra os demandos do Conselho Municipal e da execução da lei da vacina obrigatória." Correio da Manhã, 11 de novembro de 1904.

"Parece propósito firme do governo violentar a população desta capital por todos os meios e modos. Como não bastassem o Código de Torturas e a vacinação obrigatória, entendeu provocar essas arruaças que, há dois dias já, trazem em sobressalto o povo.

Desde ante-ontem que a polícia, numa ridícula exibição de força, provoca os transeuntes, ora os desafiando diretamente, ora agredindo-os, desde logo, com o chanfalho e com a pata de cavalo, ora, enfim, levantando proibições sobre determinadas pontos da cidade." Correio da Manhã, 12 de novembro de 1904.

" (...) As arandelas do gás, tombadas, atravessaram-se nas ruas; os combustores de iluminação, partidos, com os postes vergados, estavam imprestáveis; os vidros fragmentados brilhavam nas calçadas; paralelepípedos revolvidos, que servem de projéteis para essas depredações, coalhavam a via pública; em todos os pontos destroços de bondes quebrados e incendiados, portas arrancadas, colchões, latas, montes de pedras, mostravam os vestígios das barricadas feitas pela multidão agitada. a viação urbana não se restabeleceu e o comércio não abriu suas portas. (...)" Jornal do Commércio, 15 de novembro de 1904.

"Como ante-ontem, repercutiram-se ontem as correrias e arruaças dos dois dias anteriores. Como na véspera, tiveram princípio no largo de S. Francisco.

Desde que se manifestou o conflito, deu-se a intervenção da força armada, segundo ordem do Dr. Chefe de Polícia, que, por intermédio de seus delegados, determinara que a intervençào só se desse em caso de conflito ou atentado à propriedade.

Na rua do Teatro, do lado de Teatro São Pedro, estava postado um piquete de cavalaria da polícia. Ao aproximar-se o grupo de populares, a gritos e a vaias, a força tomou posição em linha, pronta a agir, caso fosse necessário. A movimentação do piquete de cavalaria aterrorizou um tanto os populares que recuaram. Depois, julgando talvez que a cavalaria se opussesse à passagem, avançaram resolutos, hostilizando a força a pedradas. O comandante da força mandou avançar também, dando-se o choque. (...) Serenado mais ou menos o ânimo popular naquele trecho, seguiu a força a formar na praça Tiradentes, fazendo junção com outro piquete que ali se achava postado." Gazeta de Notícias, 13 de novembro de 1904.

"Seria preciso não conhecermos a vida da cidade do Rio de Janeiro, mesmo nos seus dias anormais, para não compreendermos os acontecimentos de ontem que encheram de pânico e pavor toda a população.

Houve de tudo ontem. Tiros, gritos, vaias, interrupção de trânsito, estabalecimentos e casas de espetáculos fechadas, bondes assaltados e bondes queimados, lampiões quebrados à pedrada, árvores derrubadas, edifícios públicos e particulares deteriorados." - Gazeta de Notícias, 14 de novembro de 1904.

MANHÃ DE ONTEM:

"Pela Rua Senhor dos Passos, às 7 horas da manhã, subia uma grande massa de populares, dando morras à vacina obrigatória. Pelos indivíduos que a compunham foram atacados alguns bondes da São Cristovão. Ao entrar na Praça da República foram virados os seguintes bondes: ns. 140, 95, 113, 27, 55, 105, 87, 101, 38, 41, 85, 56, 31, 13, 130, 101 e 129. Em alguns casos os populares atearam fogo. A Jardim Botânico sofreu também prejuízos. seus carros no Catete e Larangeiras, foram atacados.

BOMBAS DE DINAMITE:

"Já ontem apareceram as terríveis bombas de dinamite, como elemento de guerra. A 3a Delegacia foi alvejada por inúmeras bombas atiradas pelos populares; estes, ao fim de algum tempo, conseguiram repelir a força de polícia, que foi substituída por praças do corpo de marinheiros.

"A cada passo, no centro da cidade, erguiam-se barricadas e trincheiras de onde os populares atacavam as forças militares. as ruas da Alfândega, General Câmara, Hospício, S.Pedro, Av. Passos etc. foram ocupadas pelo povo."

"Os alunos da Escola Militar do Brasil, depois de deporem o general Costallat do comando desse estabelecimento, elegeram, em substituição, o sr. general Travassos e em saída saíram em grupos, naturalmente para se reunirem na praia de Botafogo. Ao seu encontro seguiu do Palácio o 1o de infantaria do exército, sob o comando do coronel Pedro Paulo Fonseca Galvão." - Gazeta de Notícias, 14 de novembro de 1904.

Interrompemos a nossa narração às 3 horas da manhã. Pouco antes foi-nos telefonado do palácio que um delegado viria ver as provas da nossa folha para se certificar de dávamos notícias alarmantes. respondemos que as nossas notícias eram símples narração de fatos. Foi-nos então pedido para retirar algumas das notícias que enumerara e que entretanto foram publicadas por outros colegas." Gazeta de Notícias, 16 de novembro de 1904.

"A evidente prova de que toda esta agitação em torno da vacina é artificial e preparada com intuitos meramente perturbadores, está em que as arruaças começaram, justamente quando reiteradas declarações do Sr. Ministro do Interior, feitas a todos os jornais,levavam à convicção de que o que indiscretamente se publicou como sendo regulamento da lei não só o não era como o não seria nunca. A discussão sobre a questão da vacina tinha se conservado no terreno doutrinário. (...)

"Continuaram ontem infelizmente as assuadas e correrias da véspera no largo de S. Francisco de Paula, sendo necessária a intervenção da força de polícia para dissolver os grupos de turbulentos. Alguns gaiatos deram largo curso ao boato de que à tarde havia um meeting naquele largo para o fim de se protestar contra a obrigatoriedade da vacina, o que não aconteceu; mas, não obstante, desde as 5 1/2 horas começou a afluir ao lugar indicado várias pessoas, que se aglomeraram próximo à estátua de José Bonifácio.

Eram 6 horas. Notava-se no largo de S. Francisco de Paula desusado movimento, quando principiou a assuada. Não havia orador, todos se olhavam admirados sem saber porque ali se estacionavam. Afinal, dentre os populares surgiram os indivíduos Francisco de Oliveira e Lúcio Ribeiro, os quais, subindo ao pedestal da estátua de José Bonifácio fingiram que iam falar as massas. Os dois pandegos, porém, embatucaram diante da grande multidão e limitaram-se a gesticular estupidamente, sendo isso motivo de datisfação para a garotagem que os aplaudia frenéticamente. (...)" - O Paiz, 12 de novembro de 1904.

"Como nos dois dias anteriores, arruaças começaram ontem à tardinha. Não esta convocado meeting, entretanto, desde 5 horas da tarde o largo de Sào Francisco de Paula esteve repleto de gente em sua maioria curiosos."

"Enquanto se perde tempo e se despende energia nessa agitação injustificável a pretexto da vacinação obrigatória, vamos deixando de lado as questões que realmente nos interessam e que afetam vivamente a situação do país. (...) - O Paiz, 13 de novembro de 1904.

"Não há que se esconder a gravidade da situação que, desde alguns dias já, se vinha desenhando no aspecto da cidade e que tos os espíritos anunciavam porque a pressentiam e apalpavam.(...)

Verdadeiras lutas foram travadas a peito nú entre populares e as forças policiais de infantaria e cavalaria, distribuídas por fortes contingentes nos pontos onde maior era a aglomeração e onde as desordens mais se pronunciavam.

Na execução das ordens recebidas e conforme um edital da polícia publicado pela manhã, a polícia interveio na dispersão do povo, acometendo-o com cargas de espada e lança e não raro travando verdadeiros tiroteios; o povo repelia-a a pedradas, entricheirando-se como podia, e a força despejava os revólveres. Iso mesmo sente-se da relação publicada dos feridos, a maior parte por armas de fogo."

"Os estragos que a cidade apresentou na manhã de hoje, árvores derrocadas, combustores retorcidos, quebrados, e postes por terra, , edifícios com as vidraças estilhaçadas, bondes quebrados uns, incendiados outros, tudo isso dá idéia da intensidade dos conflitos de ontem e do desespero e anarquia que reinaram nas ruas, que mais tétricas e cheias de perigo se tornaram quando a noite caiu, privadas grandes trechos de sua iluminação costumada."

"Jamais podiamos imaginar que da vacina obrigatória pudessem surgir os distúrbios de ontem, iniciados na véspera, depois dos breves mas violentos discursos pronunciados na Liga Contra a Vacinação.

Combatendo a obrigatoriedade desta providência, o fizemos sempre de acordo com a lei, em nome dos princípios constitucionais e da liberdade individual, sem jamais aconselhar a resistência à mão armada, que condenamos com a maior energia porque a desordem não pode governar e o prestígio da autoridade constituída não pode parecer diante da subversão da ordem."

BARRICADAS:

"Na rua Senhor dos Passos, esquina da rua Tobias Barreto, Sacramento e Hospício foram levantadas barricadas, havendo em alguns pontos atravessado correntes e arames de lado a lado da rua. Junto a essas barricadas os populares varavam a polícia." - A Tribuna 14 de novembro de 1904.

AS MANCHETES

Vacina ou Morte (Correio da Manhã)

O Monstruoso Projeto (Correio da Manhã)

Arruaça Policial - Novas Violências - Bondes Atacados - Prisões - O Comércio Paralizado (Correio da Manhã)

A Revolta dos Alunos Militares - Gravíssimo Os Fatos de Ontem - Combate em Botafogo - Tomada de Delegacia -Montins na Saúde - Barricadas - Trincheiras - Assaltos a Casas Populares - Morte e Ferimentos (Gazeta de Notícias)

Estado de Sítio - A Conspiração - Discursos do Senador Rui Barbosa - Rendição de "Porto Arthur" - Ataque à Fábrica Confiança - Prisão do General Olympio de Oliveira - Fechamento da Escola Militar - Prisão de Alunos da Escola de Realengo (Gazeta de Notícias)

Graves Sucessos - Os Acontecimentos de Ontem - Barricadas e Tiroteios - Conflitos, Ferimentos e Mortes - Providências do Governo - (A Tribuna)


Página inicial