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AVENIDA CENTRAL
Ano: 1905

"Hoje deve ser entregue ao trânsito público a primeira Avenida construida no rio de Janeiro, que recebeu o nome de Central. Como é igualmente sabido, esta grande artéria será oficialmente inaugurada hoje pelo Sr. presidente da República, que cortará as fitas que a fecham. Quase todos os prédios concluídos terão as suas fachadas ornamentadas com bandeiras e garlhadetes.

Dentre estes, destacam-se os do Sr. Eduardo Guinle, posto à disposição da comissão construtora da Avenida e do qual o Sr. presidente da República assistirá ao desfilar das tropas, e da Rio Light and Power. O primeiro acha-se internamente decorado com muito gosto, tendo nos vastos salões, além de escudos com bandeiras encimadas por guirlandas de flores, muitos festões cruzando os tetos assim como nas sacadas que dão para a Avenida. O outro prédio que se destacará pela sua ornamentação é o em que se vê instalada a Light, que além de outros enfeites terá a fachada iluminada por 500 lampadas elétricas incandescentes multicores, tendo no centro uma estrela formada pelas mesmas lâmpadas. esse prédio pertence ao Sr. Conde Sucena. (...)

Os mastros fincados ao longo da Avenida, em número de 348, terão galhardetes e serão ligados por festões. Em 41 desses postes serão colocados escudos com os nomes dos engenheiros da comissão da Avenida, assim como também alguns com os nomes de vários construtores.

Os coretos, em número de sete, acham-se colocados nos seguintes pontes da grande artéria: um em frente à Casa Guinle; dois na praça circular; um em frente ao 1o Barateiro, em forma de açafate de flores (este coreto será o mais belo); um em frente ao Teatro Municipal e dois no trecho entre a rua do Passeio e Santa Luzia. (...)"- Gazeta de Notícias, 15 de novembro de 1905.

"Nem mesmo o mau tempo, tão inclemente e tão enfadonho desde a noite da véspera, conseguiu arrefecer o júbilo e o intenso enthusiasmo com que o povo acorreu a festejar o aniversário da República, tão bem caracterizado pela inauguração dessa monumental Avenida, que agora se oferece não somente à nossa admiração, mas à de todo o país e à do estrangeiro, como um exemplo do poder de vontade do governo federal, auxiliado fortemente pela nossa engenharia e pelos capitais e fortuna dos que viram na construção da grande artéria um emprego remunerador, do mesmo passo que uma contribuição pedida a todas as individualidades para o engrandecimento moral e material desta terra.

A Avenida surgiu diante dela como uma maravilha, como a aurora luminosa de um futuro grandioso. E todos esperavam o dia ansiosos para levarem ao Sr. Rodrigues Alves, nas palmas de suas aclamações, o testemunho do seu reconhecimento. O tempo foi ingrato, injusto, impediu na sua crueldade que o entusiasmo popular fosse o que ia ser, um longo e estrepitoso grito de saudação ao governo, representado nesse homem puro e bondoso, que na paz de sua convivência sente a grande ventura do dever cumprido.

Realizou-se ontem, às 6 horas da tarde, a inauguração oficial da iluminação da Avenida Central. A essa hora achavam-se no escritório da Light os Srs. Drs. Teófilo de Almeida, inspetor geral da iluminação pública, conselheiro Camelo Lampréia, ministro de Portugal, Pearson, Drs. Rego Barros e Paulo de Frontin, Brisson e vários engenheiros da comissão construtora da Avenida.

Os diretores da light convidaram os Srs. ministro de Portugal e Drs. Paulo de Frontin, Teófilo de Almeida e Pearson a abrir os circuitos para estabelecer a comunicação às lampadas, que em ato contínuo derramaram sobre a Avenida intensa luz.

Depois desta cerimônia foi servido às pessoas presentes profuso lunch, fazendo todos em seguida o percurso da Avenida em carros e automóveis. Apesár da chuva, a iluminação produziu esplendido efeito." A Tribuna, 16 de novembro de 1905.

"A chuva interrupta que cae sobre a cidade, desde ante-ontem, à noite, não permittiu que a inauguração da Avenida Central, tivesse o brilhantismo anunciado... A inauguração apesar do número de pessoas presentes, esteve fria. O conselheiro Rodrigues Alves foi, durante longo tempo, acompanhado por uma enormidade garotos, que pulavam de um lado para outro lado, formando um sequito incomodo e alverecido. O povo, divorciado por completo das festanças e pagodes oficiais, não teve uma aclamação, não teve um viva, para o presidente da República.

Na sacadas e janelas dos prédios já construídos, já por concluir, em alguns dos quais foram improvizados pavilhões viam-se muitas famílias.

9:00 foi lançada pelo vigário de São José, a benção à Avenida, assistindo a essa solenidade os membros da comissão construtora, além de convidados.

9:50 Chegada do Presidente da República acompanhado do Almirante Julio de Noronha, ministro da Marinha, marechal Argolio, ministro da Guerra e Dr. Lauro Muller, ministro da Indústria, Viação e Obras Públicas. O landau do chefe da nação era escoltado por um piquete de 40 praças do 9o Regimento de Cavalaria.

À chegada na Avenida, no extremo da Prainha, o chefe da nação e sua comitiva foram recebidos pelo Dr. Frontin e toda a comissão construtora. O Dr. Rodrigues Alves desfez o laço de fitas que interceptava a passagem pela grande avenida. Foi então tocado o Hino Nacional pela banda de música da Companhia Luz Stearica.

O presidente da República, seguido de sua comitiva, dos membros da comissão da Avenida, representantes da imprensa e convidados dirigiu-se então para um dos edifícios. Dali, de uma sacada adornada especialmente para o ato, Sua Exel. junto com os ministros assistiu ao desfilar das forças, que contornavam o prédio, pela rua Acre. (...)

Hontem, enquanto ao espoucar do champagne festivo e o mastigas das festivas empadas, a gente do governo inaugurava a Avenida, sob o hospitaleiro tecto dos felizardos Guinle, centenas de famílias abandonavam os lares nos carros dos benemeritos bombeiros buscando abrigo onde se refugiar da massa d'água que lhes invadiu às casas.

O dinheiro do contribuinte foi esbanjado, foi desperdiçado em indenizações vergonhosas, em que se abarrotou a advocacia administrativa, foi distribuido em negociatas e arranjos.(...)" Correio da Manhã, 16 de novembro de 1905.

"Raras vezes um acontecimento publico terá attrahido a uma extensa área da cidade mais gente do que a inauguração da Avenida Central attrahio hontem desde pela manhã á zona urbana, vulgarmente conhecida pelo nome de "centro". É evidente que a affluencia maior se localizou na nova via de comunicação, mas todas as transversaes entre o largo de S. Francisco e o Rocio, de um lado, o largo do Paço e a rua Direita, do outro, foram, desde as 7 horas da manhã, outros tantos carreiros por onde se agitou num fluxo continuo e animado um dos mais vastos formigueiros humanos que a actual geração será dado presenciar.

O facto demonstra o grande interesse da população pelo importante melhoramento que o actual Governo lega á Capital do paiz. Esse interesse, apressamo-nos em dizel-o, é de todo justificado. O extrangeiro que visitar agora a nossa Capital ja tem na Avenida um bello exemplo do progresso material que o Rio de Janeiro se sente resolvido a realizar. Está de vez morta a exlusividade de seducção que a naturaleza, e só ella, exercia sobre quantos extranhos nos visitavam. Subsistirá sempre a seducção das bahias, das arvores e dos morros, mas a Avenida já prova que estamos resolvidos a construir outras joias que nós mesmos fabriquemos sem nos limitarmos tão sómente a exhibir aquellas em que de modo algum trabalhamos.

Foi porque o animava esta mesma convicção, que o povo durante toda a manhã e parte da noite se escoou constantemente entre os dous flancos da Avenida em ondas compactas que só cessaram depois das dez da noite, ante a necessidade imperativa do descanso.

O tempo não quiz collaborar com a população na consagração do melhoramento novo, mas, considerada a verdadeira avalanche humana que com dia feio encheu a Avenida, quasi se pode abençoar o acaso do tempo, pois sem elle o estadio na nova arteria principal da cidade se teria tornado intoleravel. Ao demais, ante a má vontade do tempo, os cariocas souberam encolher desdenhosamente os hombros. As senhoras, ás janellas dos prédios já concluidos, em palanques improvisados no arcabouço dos em construção, ou pelas ruas chapinhando na lama aristocratica da grande rua elegante, pareciam affirmar que esse documento de progresso valia bem o holocausto de um vestido, de elevado preço que fosse. Do lado dos homens, uma ou outra cartola foi naturalmente votada á perdição, como tributo expontaneo á commemoração grandiosa. Os proprios soldados, marcises e serenos, pareciam elles proprios indifferentes ao gottejar da chuva sobre ou dourados e alamares das fardas e deram á Avenida a nota sympathica da sua presença. (...)" Jornal do Commercio, 16 de novembro de 1905.

"A esperança de um bello dia sagrando uma bella data e uma bella obra desfez-se, infelizmente; o sol não veiu, e foi sob um aguaceiro impertinente e odioso, fino e pulverizado a começo, grosso e encharcante depois, que se fez hontem a inauguração da formosa avenida que foi, no dia da festa da República, a concretização mais evidente e irrecusavel das suas promessas de melhores dias. O ceo amanheceu turvo e torvo se conservou até a noite, como uma carranca de sebastianista impenitente.

A despeito disto, a inauguração da Avenida Central e as commemorativas que se confundiram nesse facto, tiveram um brilho consolador. Não houve sol, mas houve enthusiasmo; e a multidão que veiu para a rua e que a despeito do chuveiro se derramou pela grande via, enchendo-a de vida e movimento, nela se conservou ate dessaparecer no angulo da rua do Passeio o ultimo soldado da desfilada militar, valeu como consagração e calor pelo mais claro sol destes claros dias de novembro. (...)

Para toda essa gente a avenida era como uma noiva linda, de que uns querem apanhar bem o geito, a maneira, a impressão das ultimas horas de solteira, e a quem outros se contentam de olhar, de alma aberta, felizes e radiosos unicamente de vel-a radiosa e feliz. (...)

Às 9 horas resoava para os lados da Ajuda a vibração marcial de uma banda de cornetas. Houve um fremito na multidão, já densa. Pouco depois apontava no extremo da avenida o brilhante estado-maior da divisão militar, a cuja frente se destacava, pequeno e incisivo, o perfil napoleonico, como escreveu um reporter das ultimas manobras, do general Hermes da Fonseca, e após elle as pontas reluzentes e as bandeirolas vermelhas do piquete de cavallaria. Mais um pouco se surgia o estado-maior da brigada da marinha, chefiado pelo contra-almirante Rodrigo Rocha, e apos este, em uma longa fila, admiravelmente alinhada, de gorros brancos, o primeiro corpo de marinheiros nacionaes. Seguiu-se o outro logo e immediatamente os pelotões flammantes do batalhão de infanteria de marinha appareceram, movendo-se como uma successão de faixas vermelhas que os guias mantivessem pelos extremos impeccavelmente distendiadas... (...)

A fita inaugural da avenida fôra rota; a grande via estava aberta officialmente para o Rio de Janeiro; e por entre a massa popular, vibrante, exaltada, movida por um explicavel e justo enthusiasmo, a carruagem presidencial, onde se alliavam as figuras do chefe do Estado e do ministro que fizera a construcção admirada, desfilava vagarosamente diante das continencias da divisão e das acclamações do povo. (...)" O Paiz, 16 de novembro de 1905.

AS MANCHETES

Luxo e Miséria (Correio da Manhã)

As Festas Da República (A Tribuna)


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