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FRANCISCO ALVES
Ano: 1952

"Num desastre de automóvel ocorrido ontem, às 18,30 horas, na rodovia Presidente Dutra, morreu, em trágicas circunstâncias, o popular cantor Francisco Alves, o "Rei da Voz". O acidente verificou-se na localidade denominada Uná, município de Pindamonhangaba.

Francisco Alves viajava com destino a esta capital, na "Buick" chapa número 11-65-80 D.F., de sua propriedade, em companhia de um amigo, de nome Haroldo Alves. No local mencionado, a "Buick" colidiu com o caminhão chapa n. 11-58-84, R.G.S., que seguia com destino a São Paulo, dirigido pelo motorista João Valter Sebastiani. O choque dos dois veículos foi violentissimo, resultando ficarem ambos seriamente avariados e tendo a "Buick", a seguir, se incendiado. Ao que se presume, Francisco Alves pereceu imediatamente, pois as chamas que dominaram o carro carbonizaram-lhe o corpo tornando-o irreconhecível. Seu companheiro foi projetado fora do carro, sendo recolhido, momentos depois, por um auto que passou no local, e conduzido à Santa Casa de Taubaté, onde ficou internado em estado de coma. O motorista do caminhão sofreu ferimentos sem importância.

O delegado policial de Pindamonhangaba, retirou o cadaver de Francisco Alves dentre os escombros do carro, providenciando para seu transporte à referida cidade, onde em diligências posteriores foi levantada a sua identidade. O Dia, 28 de setembro de 1952.

"A cidade rendeu ao filho que lhe traduzia a extensão da sensibilidade e do lirismo romântico, o culto póstumo que ele merecia. Francisco Alves, sem dúvida, o cantor maior do canto popular nascido nestas plagas, o intérprete da poesia pura que brota das almas simples e se amplia em estrofes de sentido profundo. Da sua garganta privilegiada voaram as melodias mais lindas que se inventaram para exprimir as dores e as alegrias coletivas. E os discos que fixaram as harmonias do trovador magnífico permitiram o milagre dessa consagração comovente. O homem pereceu no tremendo desastre que lhe cortou o fio da vida, mas o seu espírito, a sua alma, ficaram na voz maravilhosa gravada pela radiofonia para a duração quase ilimitada. As homenagens que as emissoras prestaram ao cantor prodigioso deram a impressão de que dos frangalhos da sua carcaça se desprendiam os sons esplendidos e vibrantes que encheram os ares da metrópole e do país inteiro, como que afirmando a fragilidade da morte diante dos impetos do gênio. E Francisco Alves desceu ao túmulo no mesmo instante em que em todos os quadrantes da pátria se ouvia a sua voz sentimental e bem brasileira...

Era impossivel ter-se uma idéia exata do número de pessoas que formavam aquela fabulosa onda humana, que provocou colápso no trânsito, acompanhando os funerais de Francisco Alves. Cem, duzentas mil pessoas? Quem sabe ao certo, se a vista do repórter se perdia ao longo de ruas e avenidas da zona sul? Foi um espetáculo comovente, o coroamento das manifestações de dor popular pela morte trágica do Rei da Voz. Durante as últimas 48 horas, a cidade se transformou de tal modo, ligando-se ao destino de um artista por vinculo do mais profundo sentimentalismo, que até parecia não ter morrido apenas um seresteiro de alta classe, mas um mistico de poderosa influência sobre multidão deslumbradas. Era o milagre do talento de um cantor, que soube interpretar, como ninguém, as tristezas e as alegrias, as venturas e os infortúnios da sua gente, dizendo no lirismo da sua voz harmoniosa e tropical o que não se pode expressar em meras palavras. (...)

As filas em frente ao edifício da Câmara Municipal, onde, até a manhã de ontem, ficou exposto à visitação pública o corpo do artista, eram engrossadas a toda hora. Pessoas de todos os níveis sociais ficaram, pacientemente, a espera da oportunidade de chegar até a urna mortuária, num tributo à memória do inditoso cantor. Por toda a madrugada de ontem, a romaria não cessou: dos bairros e subúrbios mais longinquos surgiam amigos e admiradores de Chico, que queriam render-lhe a última homenagem. Muitos levaram lágrimas e flores. Outros ficaram, silenciosos, com um nó na garganta da eça armada no saguão do legislativo da cidade. Lá compareceram desde elementos dos meios artisticos e das camadas mais humildes a figuras representativas da nossa vida pública, numa comunhão de sentimentos que deu a justa medida da repercussão que o trágico acontecimento causou em toda a metrópole. (...)" O Dia, 30 de setembro de 1952.

"São Paulo, 27 Asapress Urgente. Teve trágico fim esta noite, quando viajava em um automóvel "Buick" de sua propriedade, desta capital para o rio, o popular cantor Francisco Alves, uma das figuras mais conhecidas do "broadcasting" nacional desde longos anos.

Seu carros, à altura do Município de Uná, foi de encontro a um caminhão do Rio Grande do Sul, dirigido por João Valter Sebastiani, que foi ligeiramente ferido.

Tremendo choque causou a morte de Francisco Alves, cujo corpo foi retirado dos destroços quase irreconhecível, totalmente carbonizado.

Haroldo Alves, que viajava em sua companhia, gravemente ferido, foi internado no Hospital de Taubaté em estado desesperador.

Ao que apuramos, Francisco Alves seguia de São Paulo, onde obteve grande exito na Radio Nacional, para tomar parte no programa das 12 horas de amanhã no Rio." Jornal do Brasil, 28 de setembro de 1952.

"O que impressionou mais na morte trágica de Francisco Alves foi o ter sido vitimado no intervalo de duas audições, a que deu em S. Paulo e a que deveria dar no Rio, no espaço de poucas horas.

Esse corte brutal do destino, de quase um mesmo programa de radio transmitido pela mesma emissora, tornou ainda maior a emoção popular, que passou o dia inteiro a ouvir, por todas as estações, pelo milagre dos discos - como se quisesse fazer reparar a tremenda injustiça e a tremenda desgraça - a grande voz para sempre perdida.

A Cidade, no seu luto, encheu-se, então, da voz de seu cantor, que nunca lhe pareceu tão bela, tão comovedora e tão triste, como se chorasse sobre si mesma o desaparecimento de su dono, daquele bom e simples Chico Viola, filho dos morros, irmão do samba e amigo das serenatas e do luar.

Francisco Alves fôra, realmente, um caso raro, como é o de Chevalier na França. Desde os seus dias de estreante e, depois, de ascensão, nunca diminuira em prestigio. A suas gloria não conhecera intermitencias. Tinha chegado ao brilho do sol do meio-dia e parara, sem as ameaças do crepusculo.

Subira, como o vôo dos passaros, sem esforço, sem intrigas, sem proteções e permanecia, nas alturas, com a naturalidade das flores alpinas, que lá se encontram porque lá é o seu lugar, o seu clima e não poderiam viver na planicie.

Assim, o "rei da voz" não perdeu nunca o seu reinado, porque ele se expandia pela força, que perdura, da alma e do coração populares, tocados pelo timbre, a sonoridade e a beleza de uma voz consagrada ás melodias simples e plangentes da musica sentimental brasileira.

O seu tumulo deveria ser um grande violão, o seu "companheiro inseparável", que tanto vibrou com as mesmas canções do grande Chico e que hoje, com as cordas emudecidas, guarda as ressonancias misteriosas e eternas da voz que foi a mais bonita do Brasil. - Benjamin Costallat" Jornal do Brasil, 30 de setembro de 1952.

"Enorme massa, em que estavam representados todo o povo, estações de rádio, clubes e outras entidades populares e esportivas, figuras de expressão dos meios artisticos, sociais e políticos, acompanhou, ontem, até o cemitério S. João Batista, os restos mortais de Francisco Alves.

Dos milhares de pessoas ali presentes, muitos começaram a chegar à Câmara Municipal, de onde saiu o féretro, desde as primeiras horas da manhã, ou fizeram parte do grande número de outras, que, desde domingo, principiaram a afluir ao salão onde estava armada a câmara mortuária.

O cortejo fúnebre, cujo inicio estava marcado para às 11 horas, começou pouco depois desta hora.

Grande número de carros conduzindo flores e coroas, seguira a enorme massa que acompanhava o carro do Corpo de Bombeiros, onde foi colocada a urna funerária.

Durante todo o trajeto pela avenida Rio Branco, Flamengo, Botafogo, etc., milhares de pessoas presenciavam a passagem do féretro.

No cemitério, cujos portões foram invadidos pela multidão, não obstante as medidas tomadas pelas autoridades policiais, estabeleceu-se grande confusão, pois tôda a imensa massa queria aproximar-se da urna funerária. Em consequência, a cerimônia final foi perturbada, ficando os oradores praticamente impedidos de fazer uso da palavra. Cenas indiseritiveis de emoção se sucediam, homens, mulheres, velhos e crianças, que caiam, eram pisados, enquanto outros, presas de crises nervosas, eram socorridos. Doze pessoas tiveram que ser atendidas pelo serviço médico. Para fazer a urna funerária chegar até o local de sepultamento, foi preciso o trabalho de 12 atletas da Polícia Especial.

Cerca de duas horas levou o cortejo funebre da Câmara Municipal até o cemitério.

O presidente da República fez-se representar nos funerais de Francisco Alves pelo capitão José Henrique Acióli.

A sessão de ontem, da Câmara Municipal, durante a qual reassumiu o Sr. R. Magalhães Júnior, representante do Partido Socialista, que se encontrava de licença viajando pela Europa, foi tôda ela dedicada à memória do cantor Francisco Alves, falecido tragicamente na tarde de sábado último, num desastre de automóvel, no Estado de São Paulo. (...)" Diário de Notícias, 30 de setembro de 1952.

"Vítima de um desastre de automóvel, na Rodovia Presidente Dutra, entre Taubaté e Pindamonhangaba, faleceu o cantor Francisco Alves, que viajava, desta capital para o Rio de Janeiro, em um "Buick"no 11-56-80.

O carro em que viajava o artista nacional colidiu com um caminhão, do Rio Grande do Sul. No desastre, saiu gravemente ferido o companheiro de viagem de Francisco Alves, Haroldo de tal.

O corpo do "Rei da Voz" foi removido para a necrotério de Pindamonhangaba, de onde deverá sair para o Rio de Janeiro, hoje, domingo.

Ao terem notícia do desastre colegas do cantor, das Rádios Nacional do Rio e desta Capital, viajaram para Pindamonhangaba.

Francisco Alves nasceu na rua da Prainha no dia 19 de agosto. Começou sua vida trabalhando em uma fábrica de chapéus. Cantou no início de sua carreira radiofonica no Pavilhão do Meier, da emprêsa João M. de Deus e ingressou posteriormente no elenco teatral do Circo Spinelli. Interrompeu sua carreira com a gripe de 1918, voltando, então, mas para o teatro. Contratado pelo empresário Batista, pai de Amélia de Oliveira, no Politeama de Niterói. Dissolvida a Companhia, Francisco Alves conseguiu um lugar de figurante numa revista que estava em cena no Antigo Teatro São José, da Emprêsa Pascoal Secreto. Figurava no elenco a formosa chilena, Celia, que, apaixonada por Francisco Alves, a êle se uniu e é até hoje a esposa do grande cantor brasileiro. A consagração real de Francisco Alves começou de fato com o disco, desde "Ora Vejam Só"de Sinhô a "Pé de Anjo"." Diário Carioca, 28 de setembro de 1952.

"Contristadora a noticia infausta tomou conta da cidade: morreu Francisco Alves! A fatalidade roubou, assim, em pleno apogeu de sua carreira artistica aquêle que foi o maior entre os maiores seresteiros do Brasil. Apagou-se a "Voz do Violão" e o país inteiro chora a perda do seu astro maior, do que elevou a música popular brasileira aos pincaros da glória, do que encheu todo o Brasil com a sua voz melodiosa, vibrante e viva. O destino tem dessas surprêsas trágicas - Chico Alves morreu carbonizado no volante de seu carro, na estrada Rio- São Paulo, como carbonizado morreu também, num desastre, Carlos Gardel, outra figura do mesmo naipe e da mesma estirpe de cantores do nosso chorado Francisco Alves, o nosso querido Chico Alves das rodas boêmias, o nosso ultra-popularissimo Chico Viola. (...)" A Manhã, 28 de setembro de 1952.

"Chora o povo carioca -o povo de todo o Brasil - a morte imprevista de Francisco Alves, o "Rei da Voz", o cantor popular que sempre fôra a alma do violão, o homem de radio que soubera, décadas após décadas, sustentar o rítimo de sua expressão nacional, como o maior seresteiro que o Brasil já produziu, em todos os tempos. Francisco Alves, ou Chico Alves ou ainda "Chico Viola"como chamavam os seus intimos. Foi arrematado pela morte quando dirigia o seu "Buick", na rodovia "Presidente Dutra", no trecho da estrada que atravessa o municipio paulista de Pindamonhangaba. O seu carro chocou-se com um caminhão, transformando-se numa fogueira. Ferido de morte, Chico foi envolvido pelas chamas, o seu corpo ficou carbonizado. (...)

Francisco Alves pertencia a modesta, mas boa familia lusitana. Ele, no entanto, era brasileiro e carioca, havendo nascido na rua da Prainha. Nasceu a 19 de agosto de 1898. Terminando seus estudos primários, foi empregar-se numa fábrica. Ali, ao cantarolar enquanto trabalhava, foi notada a beleza de sua voz. Animado pelos companheiros, começou a fazer serenatas e cantar em festas íntimas, até que resolveu ingressar prodissionalmente na vida artistica. Sua estréia no Pavilhão do Meier, e quando atuou no elenco teatral do Circo Spinelli foram indices do triunfo nacional que mais tarde conseguiria. Foi contratado pelo empresário Batista, trabalhando então no Politeama, de Niterói.

Quando não havia regime de exclusividade artistica nas emissoras cariocas, Francisco Alves cantava em varias estações, já então lançando também as suas composições. Na Radio Cajuti teve ensejo de ser o descobridor de grandes valores radiofonicos, como João Petra de Barros, Linda e Dircinha Batista, Orlando Silva e inumeros outros que hoje são astros do nosso "broadcasting". Ha dez anos era exclusivo da Nacional, sendo que seus programas dominicais já se haviam tornado tradição.

O numero de discos que Francisco Alves nos deixa é imenso. Só na manhã de domingo até ás 12 horas, mais de cem gravações de sucesso foram retiradas da discoteca da emissora da Praça Mauá, nesse programa póstumo e emocionante.

Todos eram lançados com o mesmo sucesso, porque a voz de Francisco Alves não envelhecia. Ao contrário, cada dia mais brilhante e firme se tornava, não obstante o trabalho intenso que dava ás suas cordas vocais, quer no Rio, em São Paulo (onde ia semanalmente) e mesmo nas festas particulares, onde Chico Viola, em sua simplicidade e simpatia, jamais se fazia rogar.

Uma de suas gravações carnavalescas de maior sucesso foi a dos festejos de Momo, em l951, com a Marchinha "Retrato do Velho". Lembramo-nos que no baile do Municipal, no aludido Carnaval, que contou com o comparecimento do presidente Vargas, recém-eleito, foi entoada em uma só voz, pelos foliões presentes, que se aglomeraram sob o camarote presidencial.

E Getulio, sorridente, ouvia a vozearia que, na marchinha lançada por Francisco Alves reclamava musicalmente: "Bota o retrato do velho, outra vez, bota no mesmo lugar". (...)

O ultimo disco gravado pelo cantor, cujo desaparecimento veio confirmar ser ele um idolo popular, foi a canção "Deixai Vir A Mim As Criancinhas", de sua autoria, cujos direitos autorais havia oferecido à criança desamparada. Era um grande coração, sendo imensamente caritativo. (...)" Diário da Noite, 29 de setembro de 1952.

AS MANCHETES

Num Desastre De Automóvel Morreu Chico Alves (O Dia)

Cenas Comoventes Nos Funerais De Francisco Alves - Uma Multidão Incalculável Nas Últimas Homenagens Da Cidade Ao Seu Filho Querido - Desmaios De Emoção Durante O Cortejo Fúnebre, Que Durou Mais De Três Horas - O Esquife Foi Conduzido Ao Som Da Voz Do Inesquecível Cancioneiro (O Dia)

Morreu Tragicamente O Cantor Francisco Alves - Seu Automóvel Chocou-se Com Um Caminhão Quando Viajava De São Paulo Para Esta Capital (Jornal do Brasil)

Silenciam Os Violões E Chora O Povo A Morte Do Seu Cantor
Enorme Massa Popular Acompanhou O Féretro Do Cantor
(Diário de Notícias)

Morre Num Desastre O Cantor Chico Alves (Diário Carioca)

Morte Trágica De Francisco Alves - O Carro Do Popular Cantor, Após Chocar-se Com Um Caminhão, Foi Presa Das Chamas - Ficou Carbonizado - Em Una, Próximo De Taubaté, O Local Do Desastre - Haroldo Alves, A Outra Vítima, Acha-se Em Estado Gravíssimo - Emudeceu A Voz Do Violão (A Manhã)

O Povo Chora A Morte De Chico Alves - Carbonizado O "Rei Da Voz" Em Tremendo Choque De Veículos Na Rodovia Presidente Dutra - 1 Violão De 2 Mts. ; Cordas De Prata, A Homenagem Do Povo Carioca - Camara Ardente, Lagrimas E Dramas Intimos (Diário da Noite)


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