REVOLTA INTEGRALISTA
"A cidade amanheceu surpreendida com a notícia de um movimento sedicioso. Pouca gente
ouvira o rádio, às primeiras horas da madrugada, quando foram ocupadas algumas estações
e transmitidas proclamações rebeldes. Só hoje, pela manhã, a maioria dos cariocas teve
conhecimento da rebelião integralista, sufocada, imediatamente, pelo Governo da República.
Embora completamente ineficiente, a revolução direitista, por menos que tenha durado,
abalou profundamente o povo da Capital. É que o carioca se acha integrado com todo o
povo brasileiro, numa fase intensa de atividade construtora. (...)
A vigilância da polícia política espalhada em todos os setores da cidade, permanentemente,
deu a conhecer os primeiros indícios da intentona. É que no bairro das Laranjeiras, cerca
das 9h da noite de ontem, foram vistos muitos individuos moradores dos apartamentos dos
edificios da Sul-América, sairem isoladamente, para logo se juntarem a certa distância.
Provavelmente, tinham o ponto indicado para a organização do bando que, momentos depois
levava a efeito grande assalto armado. Logo, pelo telefonema ficavam o capitão chefe de
Polícia e o delegado especial de Segurança Pública e Social conhecedores de tais passos
suspeitos..
Mal acabava de ser feita a comunicação por um outro telefonema, a polícia política era
informada do assalto levado a efeito de surpreza ao Palácio Guanabara. Foi um
acontecimento violentíssimo, pois, o grupo assaltante, armado e municiado conseguiu no
primeiro momento estabelecer o pavor.
Travou-se renhido tiroteio à frente do jardim do Palácio. Foi um combate que durou pouco
porque uma parte da guarda, composta de Fuzileiros Navais, aliando-se aos atacantes,
colocou-se na mais franca rebeldia. Estava assim reforçada a horda dos extremistas da
direita. A outra parte da guarda que não quiz aderir aos rebeldes, colocando-se em situação
de indiferença foi feita prisioneira e encurralada a um flanco do jardim da Guanabara.
Com o primeiro aviso, foi determinada rigorosa prontidão na Polícia Especial, de sorte que,
verificado o assalto ao Palácio Guanabara, aquela força civil saiu para entrar logo em ação.
À sua aproximação do Palácio, ouviu-se uma farta fuzilaria. Os rebeldes, já entrincheirados
nas suas posições faziam fogo contra os seus adversários. Houve necessidade de um recuo
estratégico para tomada de posição, ao mesmo tempo que essa manobra favorecia a
localização das forças armadas fiéis ao governo. Já haviam sido tomadas providências pelo
alto comando do Exército. Assim que, imediatamente, a guarnição do Forte do Vigia teve
ordem de marchar para o Guanabara, a fim de combater aos rebeldes. Identicas providências
foram tomadas com o Batalhão de Guardas. Essas duas forças sob o comando do coronel
Oswaldo Cordeiro de Farias, interventor do Rio Grande do Sul, entrando nas suas posições,
ofereceram o primeiro combate.
Prisioneiro que estava no Guanabara, já às escuras, o Presidente Getúlio Vargas não
perdeu a sua serenidade de espírito. Afeito a embates de tal natureza, aguerrido como se
sabe, o Chefe da Nação manteve a sua atitude energica enfrentando com heroismo os
rebeldes. Foi uma surpresa para S. Excia. quando se viu ladeado pelo coronel João Alberto e
major Nelson Mello. Esses dois arrojados militares haviam saltado os muros do Guanabara
para se colocarem ao lado do Presidente. Enquando se observava isso no interior do
Palácio, fora, exposto às balas, o general Gaspar Dutra, Ministro da Guerra, dirigia em
pessoa as operações militares em defesa do Chefe de Estado.
Em consequência da forte luta, travada contra os rebeldes o general Gaspar Dutra, recebeu
um ferimento produzido por estilhaço de granada, na orelha esquerda. Não dando
importância ao ferimento recebido, o Ministro da Guerra manteve a sua posição de comando.
Apesar de senhores da situação, embora por poucos minutos, os rebeldes não tiveram
coragem de prosseguir na investida até o interior do Palácio Guanabara. É que, lá dentro, o
próprio Presidente da República, de metralhadora em punho, engrentava o perigo que o
ameaçava. Essa atitude corajosa, contribuiu para impedir o avanço dos rebeldes. (...)"
Correio da Noite, 11 de maio de 1938.
"O Brasil tem um grande, um magnífico destino a cumprir. E não pode mais admitir que
brasileiros sem fibra sem o mais dignificante dos sentimentos humanos que é o da honra, por
simples ambição pessoal, por sectarismo ou por um desvio intelectual, se voltem contra a
Pátria, perturbando a obra admirável de reconstrução nacional. (...)
Os acontecimentos da madrugada de ontem apresentam, já agora, uma significação
altíssima. A história os registrará, mas a memória dos homens fixou, desde já, uma
circunstância idelevel. O presidente Vargas empolga, hoje mais do que nunca, o país que lhe
acompanha a magnífica trajetória de administrador, servido por um patriotismo incomum e
por uma coragem excepcional, qualidade mais de uma vez postas à prova, através dos
acontecimentos que vêm perturbando o ritmo da vida nacional. (...)
A rua Pinheiro Machado, calma como sempre, nas primeiras horas de ontem, foi despertada
por grossa fuzilaria. É que a sentinela do Palácio Guanabara, vendo-se aproximar junto ao
referido palácio um caminhão cheio de homens, dá um grito de alarme. Logo após, um tiro
partiu para o ar e teve como resposta uma fuzilaria, partida dos passageiros do caminhão
que saltaram rapidos do veículo penetrando no portão principal do Palácio Guanabara.
A guarda tentou reagir, porém, foi dominada em parte, enquanto outros subiram ao andar
principal do Palácio e comunicaram o ocorrido ao presidente Vargas. S. Ex. já de pé,
rodeado da Exma. Sra. Darcy Vargas sua esposa, de seus filhos Manoel e Alzira, de seu
irmão Benjamin Vargas, e de seu cunhado Walter Sarmanho, além de dois leais sentinelas,
um fuzileiro naval e um guarda civil.
No hall do Palácio, senhor de uma bravura sem limites, num gesto resoluto, arma sua família
e dispôs-se o presidente Vargas a resistir os invasores. Já tinham sido tomadas as
providências que o caso exigia, e, em breve ali compareciam o coronel Cordeiro de Farias,
atual interventor do Rio Grande do Sul, ora nesta capital, que, com uma força do Exército
procurava penetrar no Palácio.
A fuzilaria partida do interior do Palácio presidencial não permitiu de pronto o acesso ao
jardim do Guanabara. Com a chegada da Polícia Especial e Militar, reforçaram-se
defensores do Governo que usando de um ardil penetraram pela porta lateral do Palácio
passando pelos terrenos do Fluminense F. Club.
A presença do Ministro da Guerra, com a coragem e energia que lhe é peculiar, mais
encorajou os soldados da lei que assim rechassaram os rebeldes, já de posse da parte
térrea do Palácio Guanabara.
Com a chegada inesperada dessas forças defensoras do governo, os assaltantes procuram
fugir. Quinze assaltantes foram imediatamente presos e outros que fugiam às balas eram
atingidos em parte na sua fuga.
Assim terminou essa louca e ousada aventura dos rebeldes que ficaram desbaratados pela
coragem pessoal do chefe da Nação e pelas providências prontas das nossas autoridades.
(...)"- A Batalha, 12 de maio de 1938.
"A grandiosidade tenebrosa do crime, que assombrou com a sua sequência de tragédias a
madrugada de ontem, não conseguiu sequer empalidecer, com os rios de sangue que
derramou, a não menor grandiosa atitude do Presidente Vargas, cuja serenidade não traduz
apenas a sua coragem física, mas, ainda e principalmente, a energia moral de um
predestinado à mais alta chefia da nacionalidade.
Não é possível que aquele sangue-frio, aquela calma admirável, aquele controle absoluto
que permitem providências prontas e eficazes, se limitem a uma significação tão pequena de
um bravo que a si próprio não poupa na inconsciência da luta. A coragem pessoa de S.
Excia., nunca desmentida, é o resultado de uma envergadura moral que tem como cerne o
complexo dos mais nobres anseios do povo brasileiro.
Por isso, quando o Presidente Vargas defendia de armas na mão o Palácio Guanabara
contra o assalto dos sediciosos ensandecidos, não defendia somente o seu lar ameaçado de
pavorosa chacina, mas também a tranqüilidade brasileira, que não deu procuração a
bandoleiros para lhe guardar a trilogia organicamente nacional.
Até que enfim, desde a madrugada de ontem, viram a realidade, os que ainda estavam
ludibriados na sua boa fé pela pregação de sentido, manso e evangélico, com que Plínio
Salgado procurava mistificar o movimento de primarios, cujo único impulso era a sede de
sangue e única finalidade o assalto liberticida do Poder Público. Aí está o que era o
integralismo. Valhacouto de mashorqueiros, coclave nauseante de "parvenues" do mais baixo
sub-solo moral.
A farandula tragica dos ensandecidos que, na madrugada de ontem, quiz, a passos de almas
penadas levar a efeito o ritual fúnebre, frente à mortalha da nação assassinada, como
entrevia a imaginação delirante, não passou felizmente de um sonho que está a desafiar a
psicanálise da etiologia do crime e da loucura. (...)" A Nação, 12 de maio de 1938.
"O país recebeu com tristeza e indignação a notícia da miserável agressão aos poderes
públicos, na qual o "integralismo" renegou mais uma vez as alegações ordeiras de seu
programa, desmascarando-se na ambição, no despeito e no rancor que são a realidade de
seus intuitos.
A tragicômico "putsch" integralista que salpicou de sangue brasileiro os jardins e as
escadarias do Palácio Guanabara constituiu uma aventura repulsiva e sem precedentes na
prática de montins contra o governo local. Se até pouco tempo havia iludido os que de boa fé
acreditassem nos processos de purificação anunciados e prometidos pelos adeptos do Sr.
Plinio Salgado, esses, certamente, terão visto, de ontem para cá, o que realmente significava
a sistematização daqueles preceitos de Deus, Pátria e Família que acobertavam os
propósitos faccinoras, e serviam de base a uma sedição cuja finalidade era crime contra a
Pátria. (...)
O movimento foi iniciado com uma requintada técnica de perversidade. as casas dos mais
eminentes homens públicos e militares foram escaladas para assaltos brutais e sanguinários.
A paz dos lares e a sensibilidade pelo refugio sagrado das famílias foram violadas a horas
altas da noite. Em seguimento ea esse prólogo de celeres matanças o drama da escalada do
Palácio Guanabara, residência do chefe da Nação. (...)
Sobre as trágicas horas durante as quais a família do presidente da República resistiu sem
comunicações e balda de reforços materiais à fúria dos assaltantes, ouvimos ontem um
relato de um daqueles que condividiram o perigo e a incerteza daquele transe inesperado:
Era uma hora da manhã mais ou menos, quando dois caminhões repletos de indivíduos
disfarçados em fuzileiros navais chegaram de chofre aos portões do Guanabara, declaramdo
virem de ordem superior para completar a defesa do palácio, guardado insuficientemente
pelo destacamento de costume. a primeira sentinela, não acreditando na alegação, deu
alarma.. Os atacantes dirigiram-se rapidamente ao outro portão, chamando à fala a outra
sentinela que, ao se aproximar, foi morta incontinenti.
Varando o portão já eles se dispuseram em ordem de ataque e se dividiram em grupos em
torno do Guanabara, sendo que o mais numeroso tentou atingir a portaria e subir as
escadas.
além da guarda normal cuja posição não era possível identificar no momento, a nossa
guarda interna era constituida por dois elementos de confiança que procuraram resistir com
duas metralhadoras de que dispunhamos. Uma, porém, estava desmantelada. A outra é que
serviu de ponto de apoio à nossa resistência lá no interior. Como entre os atacantes
figurasse um sargento que parecia nos ser dedicado, um dos nossos investigadores a ele se
dirigiu confiante, mas foi preso e dominado.
Ficamos, portanto, reduzidos a um investigador manejando a única metralhadora. Constituiu
uma grande "chance" para nós, não atinarem os atacantes com o lugar em que nos
encontravamos. Nessa emergência só nos restava o recurso dos telefones. Os aparelhos da
Light tinham sido, porém, desligados e nos cingimos aos telefones oficiais. Com esse nos
comunicavamos para fora e recebiamos informações dos nossos amigos.
- Mas eesas informações, perguntamos, eram de molde a tranquilizar?
- Qual! Houve um momento em que nos avisaram que a casa do General Góes Monteiro fora
assaltada, a do Ministro da Guerra idem, e que os revoltosos já se achavam de posse do
Ministério da Marinha. esse foi o momento mais cruciante, porque não nos falavam em
reforços.
O presidente, com a sua serenidade habitual, queria percorrer o palácio, para ver como
poderia reforçar a defesa. Nós todos lhe faziamos apelos a que ele não atendia.
Foi então que o nosso amigo Filinto Muller nos avisou que a Polícia Especial já penetrara
nos jardins do palácio para nos socorrer.
Estavamos todos alojados na ala esquerda, mergulhados na escuridão, e procuramos divisar
os elementos da Polícia Especial. De uma janela, pareceu-me ver, deitado, no manejo de
uma metralhadora, alguém que acreditei ser o tenente Queiroz.
Queiroz, Queiroz, disse-lhe em voz baixa, mas em vez do reconhecimento amigo caiu sobre o
palácio uma chuva de balas. depois soubemos das providências do ministro da Guerra e da
vinda do coronel Cordeiro de Farias, pelo lado do Fluminense. Um de nós abriu com cautela
a porta secreta do palácio que dá para o clube e os nossos amigos vieram se arrastando
como crocodilos.
Daí em diante, as providências se sucederam e a reação dos nossos aumentou. Foi um
verdadeiro milagre se não fomos massacrados. As únicas armas de que dispunhamos eram
seis revólveres de puco alcance. Ao todo eramos seis. Já às quatro e meia, quando as luzes
acenderam, é que vimos os rostos dos que estavam ao nosso lado. depois de alguns
minutos começamos a ver também os prisioneiros, todos com caras desconhecidas.
- E o Presidente?
- Sempre o mesmo, concluiu o nosso informante. A sua preocupação durante todo o tempo
consistiu em ver como poderia aumentar a nossa resistência e como poderia dirigil-a. Como
sempre imperturbável. Com o seu exemplo, todos permanecemos calmos e confiantes. A
coragem de um chefe vale tanto como uma boa trincheira. Ao lado do presidente, nós nos
sentimos seguros." Diário Carioca, 11 de maio de 1938.
"A Polícia Civil tinha conhecimento de que elementos da extinta Ação Integralista vinham
planejando uma revolução. Providenciando, fez investigadores especiais juntarem-se às
fileiras do sigma, a fim de melhor orientar-se a respeito do citado movimento.
Ontem, às 21 horas, a Delegacia Especial de Segurança Política e Social vio a saber que no
Quartel da Polícia Militar se apresentara um oficial acompanhado de dois civis, levando uma
ordem assinada pelo dr. Israel Souto no sentido de ser posto em liberdade o coronel
Euclydes de Figueiredo. O oficial de dia, no quartel, desconfiando, dirigiu-se à sala da
Ordem, e dali, pelo telefone, comunicou-se com o delegado Especial de Segurança Pólítica e
Social, tendo o dr. Israel Souto afirmado não ter dado tal ordem. Era evidente a cilada, e o
oficial negou-se a atender. Diante do ocorrido, o delegado Israel Souto, imediatamente,
tomou providências, distribuindo investigadores armados por todos os cantos da cidade.
Os policiais, logo de início, notaram desusado movimento em casas residenciais da rua das
Laranjeiras, moradias de integralistas conhecidos. Outros edifícios, onde entravam e saiam
homens a toda hora, foram sujeitos a estreita vigilância, sendo o dr. Israel posto a par de
tudo que ocorria. A autoridade, tomando rápidas providências, entendeu-se com os
Ministérios de Guerra e da Marinha, Polícia Especial e Militar.
Aos 4 minutos de hoje foram ouvidos os primeiros disparos, partidos de vários pontos da
cidade. era o início do levante, e providências para debelal-o foram tomadas com a maior
urgência. A ação repressora da Polícia Civil fez-se sentir mais energica no Palácio
Guanabara, residência do presidente da República. No momento em que a guarda ia ser
rendida, houve motim. (...)" Diário da Noite, 11 de maio de 1938.
AS MANCHETES
Cresce A Repulsa do Povo Brasileiro Contra A Odiosa Intentona Verde - O Crime Dos
Renegados - O Assalto Ao Guanabara No Impressionante Relato De Um De Seus
Defensores (Diário Carioca)
Resistindo E Dominando A Intentona Verde O Presidente Getúlio Vargas Ofereceu Ao Brasil
Provas eloquentes De Que A Nacionalidade Não Podia Escolher Mais Bravo E Nobre
Guardião De Sua Integridade! (A Nação)
Jugulada A Infâmia Verde (A Nação)
Jugulada, Completamente, A Segunda Mashorca Integralista
(Correio da Noite)
Dominado O Levante Dos Integralistas (A Batalha)
Os Revoltosos Serão Julgados Sumariamente Pelo Tribunal de Segurança
Golpe Integralista Irrompeu À Meia Noite, Em Vários Pontos da Cidade
Um Movimento Sedicioso Prontamente Reprimido - Assaltados O Palácio Guanabara, O
Ministério E O Arsenal Da Marinha, Estações Ferroviárias, Difusoras E Telefônicas, A
Residência Dos Generais Goes Monteiro e Valentim Benicio -Terrorismo No Centro Urbano -
Incêndios, Tiroteios E Correrias - Tentativa Contra O Tesouro E A Inspetoria de Veículos -
Muitos Mortos E Muitos Feridos (Diário da Noite)