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EMMANUEL BASSOLEIL
Uma Cozinha sem Chef



por J. A. DIAS LOPES

por JOSIMAR MELO

por MAURO MARCELO ALVES

por NIRLANDO BEIRÃO

CRÉDITOS

PATROCÍNIO

Emmanuel Bassoleil


Nasci em Dijon, na Bourgogne, em 1961. Minha infância e adolescência foram passadas em Auxonne, crescendo em uma cidadezinha de oito mil habitantes, ao lado de um pai gourmet, apreciador de bons vinhos e de bons pratos, e de uma mãe, perfeita anfitriã e cozinheira de mão cheia. Foram 14 anos de convivência com os prazeres de uma boa mesa. Em 1977, quando entrei para a Escola Técnica de Hotelaria em Dijon, estava realizando, ao mesmo tempo, um velho sonho de meu pai e um grande desejo meu. Foram dois anos de aulas, intercaladas por 15 dias de prática no Hostellerie du Château de Bellecroix, um castelo do século XVIII, em Chagny, no coração da Bourgogne. Dois anos depois, me mudei para Mercurey, a 15 quilômetros de Chagny, uma cidade reconhecida por seus bons vinhos, onde trabalhei, por um ano, no Hostellerie du Val d'Or. Nesses dois lugares, cotados com uma estrela no Guia Michelin, recebi, ao mesmo tempo, uma formação de cozinha clássica e regional.

Foi em 1980 que decidi aprender um outro tipo de cozinha: la nouvelle cuisine, muito em moda na época. Em um ano e meio entre o Lameloise, em Chagny, e o Troisgros, em Roanne ­ dois grandes mestres da culinária francesa, com três estrelas no Guia Michelin e nota máxima em todos os guias gastronômicos ­ aprendi tudo sobre essa nova cozinha mais leve, bonita e técnica, mais variada, sofisticada e criativa.

Passei um ano de serviço militar na Alemanha, como cozinheiro particular do general do regimento. Quando voltei de Baden Baden, em 1983, decidi conhecer melhor Paris, trabalhando. O caminho que todo chef de cuisine deve percorrer. Durante os seis meses no Au Pressoir, hoje um bistrô chique da capital, conheci Gaston Lenôtre, o grande confeiteiro francês. Não perdi a oportunidade de descobrir os segredos desse grande pâtissier e me mudei para o Pré-Catelan, o magnífico restaurante do Bois de Boulogne. Depois de desvendar todos os mistérios da cozinha desse brilhante profissional, acompanhei seu chef de cuisine e uma parte da equipe a Saint-Tropez, onde fizemos uma temporada de dez meses, representando o trabalho de Lenôtre, no Byblos, o mais descontraído palácio da Côte D'Azur.

Após essa agradável temporada no sul da França, voltei para Paris onde trabalhei, por seis meses, no Ambassade D'Auvergne, um restaurante típico da região central da França, que fica perto do Centro Pompidou, um espaço cultural de vanguarda. Durante esse período, recebi a proposta para meu primeiro cargo de chef de cuisine: tinha 23 anos e todo um aprendizado de cozinhas tão diferentes. Aceitei o desafio e tomei conta, até março de 1985, do La Langousterie, um restaurante de peixes e frutos do mar, em Montparnasse. Foi então que meu sonho se transformou em realidade: embarcar em um navio de cruzeiro e percorrer o mundo sem abandonar meu maravilhoso métier. Fiquei um ano como chef saucier e dei minha primeira volta ao mundo.

Cansado do mar, resolvi colocar os pés em terra e aprender novas coisas. Queria dirigir uma cozinha de hotel. A proposta do Club Méditerranée apareceu na hora certa. O convite era para inaugurar um novo village em Israel. Fiz um estágio numa escola do Club, em Vittel, conhecida estação de águas do centro-leste francês e decolei para Eilat, uma cidade na beira do Mar Vermelho, para uma temporada de seis meses. A saudade tomou conta de mim e voltei para o mar. Desta vez como sous-chef de uma brigada de 50 cozinheiros, confeiteiros, açougueiros e padeiros. Uma nova experiência que valeu a pena. Em dois anos, dei outra volta ao mundo; aperfeiçoei meus conhecimentos de cozinha clássica ­ nesse navio só se fazia as grandes bases da culinária francesa, a de Auguste Escoffier (chef de todos os chefs de cozinha); e conheci uma adorável brasileira que também trabalhava no navio. Depois de algumas escalas no Brasil, decidi conhecer melhor esse país tão acolhedor, encantador e que tanto fascina a nós, franceses. Virginia, hoje a mãe de meus dois filhos, Lucas e Thomas, foi meu melhor motivo. Quando chegamos ao Brasil, em novembro de 1987, encontrei Claude Troisgros, filho da célebre família com quem tinha trabalhado anos antes e proprietário de dois restaurantes, um no Rio de Janeiro e outro em São Paulo. E foi sem hesitar que aceitei dirigir a cozinha de seu restaurante paulista, o Roanne.

Foi um ano de aprendiz, com a ajuda de Virginia e Claude. Digo aprendizado, porque não conhecia nem o idioma nem os produtos e menos ainda o gosto dos brasileiros. Depois de um 1988 tão rico em novos conhecimentos, adotei o Brasil como meu segundo país. E São Paulo como minha cidade, uma capital tão imprevisível, tão louca e excitante. A partir de então, me associei a Troisgros e Vania F. Fontana. Quando Troisgros voltou para a França, em 1991, continuamos com o Roanne, mantendo sempre o mesmo nível e as duas estrelas, conquistando as melhores críticas dos jornalistas e clientes gourmets.

Uma de minhas preocupações é a formação de bons profissionais. Desde 1993 venho me dedicando, junto com alguns colegas, à criação de uma escola de hotelaria no Senac ­ Serviço Nacional do Comércio, que já está testando cursos piloto.

As melhores notícias chegaram no final de 1993, quando fui reconhecido como o chefe do ano ­ o Roanne ganhou sua terceira estrela. É impossível imaginar minha felicidade. Em seis anos de São Paulo ter meu nome associado aos melhores chefes de cozinha, ter o meu restaurante entre os seis melhores do Brasil. E ser aceito, junto com três amigos, no Eurotoque, uma confraria que destaca os melhores profissionais europeus e aqueles que trabalham em outros países. Apenas o Japão, os Estados Unidos e agora o Brasil receberam essa honra.

Esse primeiro livro é o início de uma nova fase. Meu desejo de dividir com o leitor um pouco do que aprendi ao longo desses anos. O apoio de Alexandre Dórea Ribeiro, que prontamente se juntou a mim; a confiança do sr. Georges Chaix, do Banco Francês e Brasileiro, em meu trabalho; somados às fotos de Sérgio Pagano; ao design gráfico de Victor Burton e à ajuda de Jean Lenoir, meu tio, autor de Le Nez du Vin, na escolha dos vinhos, tornou meu projeto ­ e antigo sonho ­ possível.

Emmanuel Bassoleil ­ Uma Cozinha sem Chef foi a forma que encontrei para passar minhas receitas mais simples. Escolhi esse título porque são receitas que não precisam da presença de um profissional ao lado. Todas foram preparadas e testadas, uma a uma, com a ajuda de três pessoas importantes em minha equipe: o Carlão, meu braço direito, Pedro e Frederico, dois garotos promissores nessa brigada de nove cozinheiros, tão eficaz e unida, que formei e tenho hoje no Roanne. Sem esquecer João, Reginaldo, Nilton e meu confeiteiro Edgar, pessoas que nos deram todo o apoio durante os testes.

A criatividade do leitor é sempre bem-vinda.

Acrescentar, mudar, trocar ingredientes, molhos, guarnições, tendo à mão produtos de qualidade, é sempre possível na cozinha que faço, sem alterar o sabor dos pratos.

Em Nostalgie, o capítulo final, mato a saudade dos primeiros pratos que aprendi a fazer sozinho. Escolhemos fotografá-los na Bourgogne, a região onde nasci e cresci, na casa de meus pais, para melhor transmitir o verdadeiro clima da cozinha francesa. Da cozinha de minha infância.

EMMANUEL BASSOLEIL

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