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COPA DO MUNDO
Ano: 1950

Aqueles que compareceram ao Estádio Mendes de Morais, na tarde de ontem, cheios de fé e alegria no onze brasileiro jamais poderiam imaginar que, numa partida decisiva, onde bastava o empate para nos dar o título máximo, pudessemos deixar o gramado vencidos. E sobretudo vencidos por um quadro que, embora fazendo jus ao triunfo, por ter aproveitado as duas oportunidades que se lhe ofereceram, foi, no atual certame, menos produtivo e menos positivo do que a equipe brasileira.

Por isso mesmo, o espetáculo que se desenrolou aos nossos olhos, após o apito final de Georges Reader, foi desses que, por suas caracteristicas impressionantes, tão cedo não sairão da retina daqueles que tiveram o ensejo, o triste ensejo, digamos assim, de presenciá-lo. Aquela multidão de duzentas mil pessoas não teve coragem de deixar o estádio.

Tinha-se a impressão que estávamos em um Dia de Finados, assistindo ao enterro de um ente querido. As dependencias do "Colosso do Derbi", pareciam lotadas por milhares e milhares de parentes e amigos do suposto defunto, que o pranteavam, num silêncio só interrompido pelos soluços de muita gente que não resistiu à intensidade da dôr. Lá em baixo, no gramado, os jogadores uruguaios, ao comemorar o grande a grande conquista, pareciam ateus profanando um lugar sagrado...

Quando, minutos depois, a massa começou a deixar o estádio, a tristeza estava estampada em sua fisionomia. Por tôdas as ruas, por tôdos os cantos, a mesma decepção, a mesma dôr. A cidade adormeceu de luto... (...)

Tristeza geral causou a vitória do Uruguai sôbre a seleção brasileira, na tarde de ontem, justamente no momento em que o campeonato do mundo estava ao alcance de nossas mãos. Tristeza geral, repetimos, mas não a tristeza mansa dos que sabem perder; era antes uma espécie de revolta contra tudo e contra todos, a condenação inapelável dos nossos jogadores, a severa crítica contra a nossa tática de jogo e, finalmente, um mundo de acusações desabando, implacável, contra o técnico Flávio Costa. Numerosas substituições de jogadores começaram, de repente, a ser apontadas como necessárias a uma vitória que já estava bem distante.

Os mesmos jogadores que abateram com tremendas goleadas os selecionados da Espanha e da Suécia, já não se apresentavam aos olhos do público como os esforçados "cracks" que tantos aplausos mereceram... Tudo estava esquecido, condenado, imprestável. Zizinho, apenas, era o condutor das mais belas jogadas. Mas, Jair não passava de um fantasma dançando na tarde triste do Maracanã; e Ademir, o goleador em primeiro lugar na Copa do Mundo, era tão inútil quanto uma coisa morta. Esse o terrivel julgamento do nosso público após soar o apito final...

Há, porém, muita coisa esquecida. Na pressa das conclusões ditadas pela decepção da grande surpresa, foi esquecido o próprio valor dos jogadores uruguaios; o fator sorte, tão importante em futebol, que favoreceu em todos os sentidos a seleção oriental; e, mais do que tudo, a própria razão de todos os acontecimentos.

Um dia, Napoleão, meio louco e meio soldado, saiu da França e começou a dominar o mundo. Os seus exércitos foram crescendo em entusiasmo e se transformaram numa gigantesca horda invencível. A História narra os seus feitos mais incríveis, as suas conquistas quase impossíveis, os seus lances de heroismo. Ninguém podia vencer Napoleão e êle, em seus sonhos de louco, já se considerava o senhor do mundo. Mas nasceu a derrocada do inesperado: Waterloo. Seria possivel a destruição dos exércitos e dos planos do poderoso conquistador? Em Santa Helena, sozinho e amargurado, êle próprio não encontrou a explicação que o universo inteiro procurava, atônito. Ele apenas perdera a batalha...

A seleção do Uruguai equivale ao nosso Waterloo na "Copa do Mundo". Envolvidos pelo entusiasmo justissimo das vitórias iniciais, com a nítida superioridade sôbre os jogadores europeus, esquecemos a possibilidade de uma surpresa tão desagradável e tão inesperada. Começamos, portanto, a procurar justificativas numa provável e inexistente culpa dos nossos jogadores e do seu técnico. Esquecemos tudo, até mesmo a nossa condição de "donos da casa", de organizadores, em 1950.

Felizmente, não tiveram maiores consequências os comentários das rodas exaltadas. Pouco a pouco, vai nascendo maior ponderação nos julgamentos, menos apressados, e fazemos raciocínios. Vamos recebendo a amarga derrota como ela deve ser aceita e acatada: com a certeza de que, pelo menos, ontem, á tarde, os uruguaios jogaram melhor futebol. E com êles estava a sorte e o destino da Copa do Mundo..." Folha Carioca, 17 de julho de 1950.

"E o que ninguém previa aconteceu. O Brasil perdeu o campeonato do mundo na última partida, ficando o cobiçado trofeu em poder dos uruguaios. Foi mais uma lição, dentre as tantas que já temos tido, deixando fugir o triunfo a hora decisiva. E agora não existe qualquer desculpa. Das outras vezes culpava-se o ambiente estranho, a torcida contrária, o juiz e tantas outras coisas que seriam de consôlo ás derrotas que tantas vezes já nos impuseram argentinos, italianos e os próprios uruguaios, de quem somos velhos fregueses. Domingo tinhamos tudo a nosso favor: o campo, a torcida e, além disso, o "handicap"do empate que nos garantiria o titulo. O juiz Mr. Reader teve uma arbitragem perfeita e a êle não se pode atribuir a menor responsabilidade pelo fracasso do nosso selecionado.

Perdemos porque jogamos menos. Os uruguaios foram superiores na técnica e no coração. A Taça "Jules Rimet" está em boas mãos. Nas mãos daqueles que na hora decisiva souberam disputá-la com classe e com flama. São êles os merecedores do título de campeões do mundo.

Quem assistiu o quadro nacional jogar com a Suécia e com a Espanha, uma verdadeira orquestra sinfônica, nem por sombra reconheceria o mesmo quadro naquele que domingo jogou no Maracanã contra os orientais. A sinfônica desafinou e diluiu as esperanças dos duzentos mil espectadores que madrugaram no estádio e dos milhões de torcedores de todo o país que pelo rádio acompanhavam ansiosos o desenrolar da peleja.

Muitos argumentam com o azar para explicar a derrota, mas não reside no imponderável a explicação do fracasso. Ele veio em consequência do bom desempenho dos uruguaios e das falhas do nosso "onze". Falhas que sempre existiram e que nos cansamos de apontar desde os primeiros jogos. O nosso quadro jogou sempre, praticamente com três homens na linha de frente - Zizinho, Ademir e Jair. Os pontas Chico e Friaça jamais tiveram condições técnicas para integrar a seleção. Quando se tratava de enfrentar adversarios mais fracos e principalmente que adotam o sistema europeu de jogo, sem marcação pessoal sôbre os jogadores, as falhas desapareciam e os elementos fracos eram esquecidos ante a virtuosidade e a eficiência do trio central.

Mas com os uruguaios a coisa foi diferente. Eles adotam sistema de jôgo semelhante ao nosso, marcando rigidamente os dianteiros, e, além disso, sabiam que o "team do Brasil resumia-se, na linha atacante, a Ademir, Zizinho e Jair. Sôbre êstes três homens, foi feita uma marcação eficiente, um verdadeiro bloqueio e o resultado não se fez esperar. Na final o "placard" acusava 2 a 1 para os uruguaios.

A responsabilidade principal recai, pois, sôbre o técnico, teimando em incluir um Friaça bizonho e sem condições de jôgo e insistindo com um Chico confuso e dispersivo, quando tinha um Rodrigues em plena forma para ser lançado. Adãozinho, outro elemento de valor, ficou todos os jogos na cêrca quando poderia ser lançado no centro, deslocando-se Ademir para a ponta direita, como o próprio Flávio já fez uma vez com excelentes resultados, num sul-americano.

Além disso, faltou aos nossos jogadores, a flama necessária, coisa que sobrou aos nossos adversários. Do naufrágio salvaram-se Zizinho, Bauer, Augusto e Juvenal. Os restantes deixaram-se levar pelo nervosismo e jogaram abaixo da critica, inclusive Jair, acovardado com a marcação severa do velho Obdulio Varela.

E como se não bastasse tudo isso, Bigode, um jogador sempre eficiente, disputou uma partida sem qualificativo, fazendo asneiras a grande e deixando-se bater tôdas as vezes pelo admirável Gighia, o ponta direita do Uruguai. Também Barbosa esteve num dia negro, engolindo um autêntico frango no "goal" que deu a vitória aos orientais. (...)" Diário do Povo, 18 de julho de 1950.

"Perdeu o quadro brasileiro, na tarde de anteontem, uma oportunidade que jamais teve qualquer outro, para o conquista do titulo máximo do fuebol mundial. Não foi correspondido o sacrificio de milhares de torcedores. Para o quadro nacional, não mediram exigencias, aqueles que tudo receberam com abnegação as inúmeras dificuldades. Desde noites ao relento até o perigo constante após, a entrada no Estadio. Sofreu o torcedor contra todos os fatores, com um unico desejo. Vitoria do quadro nacional. E, infelizmente, não foi correspondido todo este sacrificio.

Vimos um quadro sem a mínima noção do que significava aquela massa humana comprimida desde as primeiras horas da manhã. Jogaram os nossos, com um completo desinteresse pelo resultado final da luta contra os uruguaios. Não faltou ao quadro nacional, nada absolutamente nada para jogarem com mais estimulo. Assim, o resultado foi um "scratch" psicologicamente derrotado, se agigantar contra o pseudo campeão mundial confiante em goals que naturalmente viriam do céu. Sofreu o selecionado nacional, uma derrota, a perda de um titulo, contra um quadro que teve a seu favor, apenas noção de responsabilidade e desejo de vencer.

Teve o selecionado uruguaio o prêmio de uma vitoria que não pode sofrer contestação. Vencendo o Brasil, conquistaram o titulo pela segunda vez de campeões mundiais. A êles o nosso reconhecimento pela fibra e bravura demonstrada na peleja final do IV Campeonato Mundial de Futebol. Aos nossos, que a lição sirva de exemplo e em competições futuras recuperem o prestigio tão tristemente perdido, numa batalha, que ao povo brasileiro sòmente trouxe a desilusão." Diário do Rio, 18 de julho de 1950.

"A derrota foi um golpe. Ninguem deixou de sentí-lo. Quando o Uruguai marcou o segundo goal o silencio que se fez no Estadio - o silencio de duzentas mil pessoas - chegava a assustar. Era a desolação da derrota. A multidão ficou parada sem querer acreditar no que via. O Estadio não se enchera para aquilo. Não fôra para aquilo que se travara a batalha das cadeiras, das arquibancadas e das gerais. Não fôra para aquilo que milhares de brasileiros tinham vindo ver o último match do campeonato do mundo. Todas aquelas duzentas mil pessoas haviam marcado encontro no Estadio para saudar os brasileiros como campeões do mundo. Por isso o Estadio se tornou pequeno: era o maior do mundo mas nele não podia caber todo o Brasil. As outras cincoenta milhões de pessoas que ficaram de fora, perto e longe, no centro, no norte e no sul do Brasil.

Tudo parecia anunciar a vitoria final, embora desta vez os adversarios dos brasileiros fossem os uruguaios. Fosse, sobretudo, o coração dos uruguaios. Irresistivelmente se formou o pior dos ambientes para os brasileiros, o melhor dos ambientes para os uruguaios. O pior dos ambientes para os brasileiros porque parecia o melhor; o melhor dos ambientes para os uruguaios porque parecia o pior. Foi o que não se quis ver antes do match.

Os uruguaios e não os brasileiros se tinham colocado numa posição única. Podiam perder de cinco e estava bem. Voltariam para Montevidéu de cabeça erguida. Todos os uruguaios, os que tinham vindo animar a "celeste", os que não tinham podido vir, e que ficaram de longe a torcer por eles, seriam unânimes em reconhecer que eles haviam feito o máximo. Qualquer resultado era bom para os uruguaios que quase tinham perdido da Espanha e da Suecia, goleadas pelo Brasil. Para o Brasil só havia um resultado bom: a vitoria. O Brasil tinha tudo a perder, o Uruguai nada tinha a perder. Tudo explicava e justificava de antemão, uma derrota uruguaia. Nada parecia sequer explicar ou justificar a simples hipótese de uma derrota do Brasil. Tudo isso aumentava tremendamente a responsabilidade do scratch brasileiro.

É preciso levar em conta essa responsabilidade tremenda para que se compreenda a especie de inibição de alguns jogadores brasileiros. A inibição de Bigode que em certos momentos quase não podia caminhar em campo, a inibição de Barbosa que nos dois lances decisivos se movimentou sempre com atraso fatal. Quando os jogadores brasileiros foram surpreendidos pela possibilidade da derrotas não resistiram. Pouco se mostraram à altura das circunstancias. A ameaça de derrota veio no pior dos momentos: quando a vitoria que se esperava parecia consagrada. Depois do goal de Friaça que valia por dois. O goal de Friaça, porém, não deu ao scratch brasileiro a tranquilidade necessaria para assegurar a vitoria. Os brasileiros, em vez de se guardarem, de repousarem mais na defesa, entregaram todas as esperanças no ataque.

Não se contentaram em vencer: queriam vencer por dois, por três, queriam golear. Golear um adversario que lutava sobretudo para não ser goleado. E que, por isso, no um a zero, se concentrou mais na defesa. Aquele um a zero que surgira no inicio do segundo tempo servia aos uruguaios como um grande resultado. Assim os uruguaios não se perturbaram, lutaram para manter aquele um a zero que embora contra era sempre uma porta aberta para o empate. Se o um a zero era um grande resultado para o Uruguai um empate seria como uma vitoria.

Os brasileiros, pelo contrario, viram no um a zero um placard pequeno demais para a festa da vitoria. E chegado o empate receberam-no como um desastre. Sem se lembrarem que o empate lher daria o campeonato do mundo. Aceitaram melhor o zero a zero. O zero não os perturbou. Mesmo durante todo um tempo. A medida que o tempo passava os brasileiros se sentiam melhor. Daí o volume cada vez maior de ataques que realizaram.

Houve um momento em que os uruguaios quase perderam a cabeça. Mas no primeiro tempo. Voltaram mais tranquilos no segundo tempo. E voltaram mais tranquilos porque o resultado do primeiro tempo fôra excepcional para eles. Depois do um a zero até o um a um se contentaram em conter a ofensiva brasileira que se tornava cada vez mais desesperada. E digo desesperada porque os brasileiros se deixaram empolgar pelo dominio e martelgram sempre no lugar errado. Na especie de ferrolho formado pela defesa uruguaia. Sem aprovitar a lição de um único goal. A maneira de invadir a defesa uruguaia não era pelo centro aferrolhado, era pelas pontas. Tanto que Friaça não teve dificuldade em abrir o escore. Alem disso no centro só havia Ademir para invadir a area, e Zizinho para ajudar a invadi-la, para forçar uma invasão. Jair ficou de fora da area, a ponto de forçar Chico a deslocar-se para forçar a defesa uruguaia com arrancadas corajosas. Enqando o placard esteve de um a zero os jogadores brasileiros se deixaram enganar pelo dominio parecido ao daquele com a Suiça. Só que desta vez os adversarios dos brasileiros não eram os suiços, eram os uruguaios. (...)

O que não estava nos calculos de ninguem era uma derrota contra o Uruguai. Por isso eu digo que se formou o pior ambiente para o scratch brasileiro. O ambiente da vitoria certa. Não foi a certeza de vitoria que derrotou os brasileiros. Foi a imperiosidade da vitoria. A exigencia de vitoria. E de grande vitoria. Ninguem discute a superioridade do football brasileiro sobre o uruguaio. Nem mesmo os uruguaios, até depois da vitoria. Uma das maiores glorias da celeste há de ser esta: a de ter derrotado os melhores jogadores de football do mundo, o quadro que realizara as suas maiores exibições de que há memoria no football mundial. (...)" - Jornal dos Sports, 18 de julho de 1950.

"Não vamos culpar ninguém pelo que aconteceu. Não é justo, e, além do mais, é um menospreso ao adversári, que foi valente e fez jús à vitória.

Depois, em nada adiantará. Não nos devolverá o título. É claro, que houve falhas. Falhas porém, que, para quem acompanha futebol sabe ser comum em pelejas como a disputada na tarde fatídica de domingo, no estádio Municipal.

Perdemos um título que parecia ajustado para nós. Perdemos, todavia resta-nos o consôlo de termos perdido com dignidade, e para quem, na verdade, são autênticos campeões, - os uruguaios.

Mas deixamos de lado tudo isso. Passemos aos fatos.

A peleja começouem um ambiente demasiadamente otimista para os nossos rapazes. Imprensa, rádio, paredros, emfim, toda aquela imensa massa que se comprimia no estádio Municipal, inclusive os proprios delegados uruguaios, não pensavam em insucesso do Brasil. Os recentes feitos contra a Iugoslávia, Suécia e Espanha não podiam deixar dúvida. O Brasil jogando em casa, com a assistência a favor e com o mesmo quadro, não podia perder para o Uruguai, que vinha de um empate cavado contra os ibéricos e uma vitória difícil sôbre os nórdicos. Afirmar-se coisa diversa, é querer ser profeta.

O que se sabia, - e disso nunca discordamos de quem assim pensava, - era que os "celestes" nos obrigariam a lutar muito pela vitória. Jamais, porém, podia se supor em derrota, mesmo levando em conta que em três outras vezes anteriores (24, 28 e 30), foram os nossos rivais os herois da jornada.

Este otimismo, pois, justo sob todos os títulos, foi a causa da derrota. Embora Flavio o combatesse energicamente, conversando com cada "crack" a quem explicava tudo; embora chegasse até a ser grosseiro com visitantes da concentração que falavam aos atletas como se já fossem campeões; nada disso valeu. O otimismo que tomara conta de todos, e passara-se também aos "cracks". E isso foi fatal para as nossas cores. Em partidas de futebol ninguém ganha na véspera. O jogo é jogado em campo, para onde vão onze atletas de cada bando lutar pelo mesmo objetivo: a vitória.

Enquanto isso ocorria em relação aos brasileiros, no lado dos orientais tudo era diferente. Pensavam em vitória. Todavia, encaravam o prélio dentro do prisma certo. Tinham os uruguaios sobre os ombros a responsabilidade de o prestígio dos campeões de 24, 28 e 30. Sabiam que um empate seria fatal. Medindo todas essas coisas foram para campo dispostos a vencer. (...)" A Manhã, 18 de julho de 1950.

"As lagrimas que humedeceram quase 50 milhões de olhos bem exprime a dôr, a desolação do publico brasileiro pelo resultado imprevisto de domingo no Estadio Municipal. E sem desprestigio da verdade, pode-se dizer que, o publico não merecia tão dolorosa recompensa pelo sacrificio, por tudo que fez no sentido de prestigiar o nosso selecionado e render-lhe as homenagens que fariam jus, no caso da conquista do titulo. As noites de vigilia por que passou na ansia de adquirir um ingresso para penetrar no estadio, as horas interminaveis que permaneceu na fila com tal proposito, amanhecendo ainda na porta do estadio, sem satisfazer as naturais obrigações de uma alimentação regular, provou que o povo se mostrou indiferente a propria razão da normalidade, para presenciar o choque que consagraria onze jogadores e 50 milhões de brasileiros! Todos os sacrificios eram infimos de mais, para atender a tão grandes anseios do coração.

As duas jornadas anteriores não deixavam transparecer quaisquer duvidas, quanto a possibilidade de conquistarmos o titulo, porque a convicção do torcedor não se baseava nas considerações honestas da imprensa e outros veículos de informações. Ele havia presenciado com os seus proprios olhos, as duas vitorias gigantescas que não davam margem a receios, quanto a batalha final, a que seria memoravel e gloriosa para as nossas cores. E quando chegou o domingo, nesso domingo de sol e de vida, que seria marcado na historia, como um dia de gloria para a nossa patria, notou-se uma agitação sem precedentes, porque o publico já as primeiras horas da manhã, colocava-se em fila, na ansia de penetrar no estadio para assistir a um prelio que só seria iniciado 9 horas depois (!)

Esse povo que esquecendo todas as agruras da vida, havia aprendido a sorrir em todos os instantes, trazendo nos labios aquela esperança convicta, emudeceu ao cabo dos noventa minutos de batalha, porque a decepção o deixou estremecido. Aquela imensa multidão ficou imovel, paralizada, sem saber o que fazer, como quem ainda estivesse aguardando alguma coisa, a jornada gloriosa, o sonho dourado que durante varios dias, enriqueceu os seus corações. Só mais tarde, quando o sol se escondeu, foi que o povo compreendeu que a sua presença na Maracanã de nada mais valia e assim começou a retirar-se numa lenta e trsistonha procisão, acompanhando o féretro da ilusão mais linda que viveu. (...)" O Jornal, 18 de julho de 1950.

"Não houve nem as correrias costumazes à saída do estadio. Era uma autentica retirada que empreendia aquela torcida exausta, coberta, de pó e tristeza. Esconderam as serpentinas. Jogaram fora os confetis, entregaram-se ao cansaço. Parecia até a madrugada de quarta-feira de cinzas. Ninguem falava. Só no bonde, passados os primeiros instantes, começaram os argumentos. Procurava-se justificar, ninguém conseguia. Chegou por fim o desabafo: foi o azar. Azar de que? De muitas coisas. Não viram que começamos, hoje, pelo lado contrário? Não viram que pela primeira vez atacamos contra a avenida Maracanã, de inicio? argumentou um. E logo outro: e tambem pela primeira vez o Ademir não abriu o escore? tudo isto deu azar. Só isto, não. Vocês nào viram o principal, argumentou um terceiro. O maior azar foi o Mendes de Morais. Êle é que foi o culpado. Como dá azar o nosso amigo... Surgiram os apartes. É mesmo. começou por chamar os uruguaios de campeões do mundo... E o locutor: O Prefeito vos falou uma vez e o time venceu. O Prefeito dá sorte. Puxa, vai para o olho mecânico a Ramona.

Descemos, pensando na maneira original daquela gente humilde encarar uma adversidade. Mas tinhamos de continuar caminho. E lá fomos de lotação para a zona sul. A conversa interrompida com a nossa chegada, retomou logo o fio:

- Foi mesmo uma atitude infeliz do Mendes de Morais.

Olhamos surpresos. Também ali a superstição vigorava? Mas não. Desta vez eram outras as razões.

O Prefeito nunca deve ter ouvido em psicologia. Aquela historia das duzentas mil pessoas esperando pela vitoria e dos cinquenta milhões querendo o triunfo deveria ser dita numa situação justamente inversa a da nossa. Se nos sentissemos inferiorizados, se entrassemos em campo com o moral abatido, convencidos da impossibilidade de vencer. Aí sim um estimulo daquela natureza. Porém nunca na situação de hoje. O Prefeito aumentou-lhes a responsabilidade, trouxe mais encargos sôbre seus ombros, aumentou o nervosismo, enfim enfraqueceu-os. O fato é que não podia perder a oportunidade da demagogia... eram duzentas mil os presentes, sem falar nos radio-ouvintes..." Correio da Manhã, 18 de julho de 1950.

AS MANCHETES

Este "Goal" Eliminou O Brasil - Tristeza Na Face De Todos - Tombou De Pé O Brasil - Os Uruguaios Jogaram Melhor E Daí A Derrota da Nossa Seleção No Prélio Efetuado Ontem (Folha Carioca)

Venceram Os Melhores - Merecidamente Os Uruguaios Sagraram-se Campeões Do Mundo - Ante Um Adversario Forte, Evidenciaram-se As Falhas Do Nosso Selecionado - A Culpa Do Tecnico - Novo record Mundial De Renda - Notas (Diário do Povo)

Faltou Fibra Aos Jogadores Nacionais Que Não Corresponderam Á Espectativa de 200 Mil Torcedores Representando 50 Milhões De Brasileiros (Diário do Rio)

Mario Filho: O Segredo Da Vitória Dos Uruguaios: Só Os Brasileiros Tinham Tudo A Perder (Jornal dos Sports)

Vitória De Raça - Lutando Com Alma E Coração, Reconquistarm Os Uruguaios A Sipremacia Do "Soccer" Mundial - Não Vamos Culpar Ninguem - Otimismo Fatal (A Manhã)

Ainda Nos Resta Um Ingrato Consolo: A "Copa" Ficou Na América, Provando A Inconteste Supremacia Da Nossa Escola (O Jornal)

Vai Para O Olho Mecânico A Romana (Correio da Manhã)


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