>> Matéria Anterior:
     Lima Barreto
>> Próxima Matéria:
     Sinhô

RUI BARBOSA
Ano: 1923

"Na vida da nacionalidade brasileira não há maior vulto do que aquele que acaba de desaparecer: Ruy Barbosa. Tão eminente era ele, que encarnava a própria Nação, no que ela tem de mais alto, de mais nobre, de mais puro. Repetidas vezes o povo do Brasil sentiu essa estranha e rara impressão de ver Ruy Barbosa significando a própria existência da Pátria, na sua alma elevada e na sua máxima grandeza. Grande e incomparável na organização do regime republicano; grande e incomparável em Haya, - a Pátria brasileira compreendera, enfim, a representação da sua personalidade como a da própria representação.

Ele era o pensamento mais alto; as suas aspirações mais grandiosas. Toda a sua vida se devotara ao Brasil num afeto que não será jamais ultrapassado por nenhum homem público deste país. Toda a sua vida se desenrolou entre tremendas tempestades, e nas suas lutas e controvérsias ele foi sempre o grande alentador das nossas energias cívicas e morais. Combatendo, no império, pelas reformas liberais e pela democracia, ele foi o maior fator de impulso que levantou a República e abateu a monarquia.

Na República ele foi o seu maior sustentáculo; e o seu verbo divinizado consagrou-se à glória das campanhas cívicas, em que a nação pulsou com o seu coração e o seu pensamento, ardentes e cintilantes do mais puro ideal republicano! O maior gênio da nacionalidade - a sua obra - confunde-se com a existência nacional, as suas forças gastaram-se no devotamento incessante ao país. (...)

Ruy Barbosa ficará como a maior tradição da nacionalidade, e o fato da sua morte, agora que as paixões incendiadas vão aplacar os seus ímpetos, fará com que apareça imaculado e venerado, alto e intangivel como um deus. (...)" A Pátria, 2 de março de 1923.

"Entre as maiores desgraças que, nesta época sombria, cheia de incertezas, vacilações e temores, poderiam desabar sobre a Nacionalidade, nenhuma será comparável à morte do conselheiro Ruy Barbosa. Na realidade, esse super-homem excepcional era numen tutelar que velava pelos destinos nacionais. (...) Não há, no Brasil, outra personalidade que possa ser comparada a Ruy Barbosa (...)

Moço ainda, no parlamento do Império, começa ele a agitar a sua mascula personalidade. Batalha pela eleição direta. É um dos operários mais prestimosos da campanha que derruiu o edifício negro da escravidão. Levanta o problema do ensino público e produz dois monumentais pareceres - até hoje consultados como orientadores seguros e firmes. Ergue a bandeira da Federação, para salvar as províncias da centralização que as anemizava, e, por amor desse princípio, recusa uma pasta de ministro no gabinete Ouro Preto.

Vem a República, em cuja "pedra angular está embutido o seu nome", como ele mesmo disse, e vemol-o, então, como o construtor máximo das instituições e formulas políticas que nos regem. A sua passagem pelo Ministério da Fazenda ficou assinalada por providências e medidas a que, anos mais tarde, os seus impenitentes adversários e defratores tiveram de recorrer, como salvaterio das finanças nacionais.

Daí por diante, não houve grande momento da nossa vida de povo livre em que essa extraordinária figura moral não aparecesse, predizendo e mostrando ao povo o caminho certo e seguro da salvação pela liberdade. Na campanha civilista, em que não se poupou a cansaços e fadigas para poupar ao país a implantação humilhante do militarismo em nossas instituições, Ruy Barbosa excedeu-se a si mesmo, conseguindo despertar, nas nossas populações indiferentes, a chama sagrada da fé cívica.

E está na memória de todos o que foi essa campanha contra o obscurantismo da política nacional, coroada pela vitória nas urnas, fraudadas, em seguida, pelos malandrins da política oficial, que despojaram Ruy Barbosa da vitória que a Nação lhe conferira. Jurisconsulto de oracular sabedoria, orador de asssombrosos recursos verbais, mestre incomparável do idioma de Camões, escritor dos mais completos da época moderna, senhor d'um estilo que vibra em todas as gamas e d'uma foma que é musculo e sangue, o conselheiro Ruy Barbosa é uma destas figuras inconfundíveis que mui raramente, de século em século, honram a Humanidade. (...) A Tribuna, 2 de março de 1923.

"O eclipse de um genio... Com este monosílabo se definia um mundo. Este mundo de fulgurações imprevistas se nos afigurava tanto mais raro, quanto se continha no pequeno espaço do cerebro de um homem ... Rompida, porém, quase de súbito, a curva fechada da sua gravitação, em torno de um sol, que acreditamos fosse o genio da Justiça, ele, se não veio desaparecer, propriamente, pelo menos entrou em conjunção com outras, eclipsando-se! (...) Enquanto existir pelo menos a língua de Camões, Ruy, o seu maior poeta em prosa, não passará! (...)

A cidade amanheceu enlutada sob a pressão causada no espírito público pelo doloroso acontecimento. Cedo, ainda, o comércio já apresentava o aspecto anormal dos dias tristes. Mais tarde, hasteadas as bandeiras a meio pau, aumentou, se possível, essa tristeza. À porta das redações, o povo procurava informações sobre as homenagens que iam ser prestadas ao eminente brasileiro, cujo corpo, já se sabia, deveria descer à tarde, de Petrópolis para ser colocado em exposição no edifício da Biblioteca Nacional. Ainda não passara a surpresa do sucedido. O último comunicado da Agência Americana, tranquilizava um pouco os admiradores do ilustre brasileiro, que às 9 horas, mais ou menos, receberam a notícia do desenlace. (...)

Ruy Barbosa foi, todos o recordam, quase vitimado pela uremia, há poucos meses. O mal foi debilitado, mas deixou completamente perturbadas as funções do resistente organismo do eminente brasileiro. Adoecendo, agora, de outro mal, Ruy Barbosa veio ainda a morrer em consequência do envenenamento produzido por aquele ataque de uremia, pois teve o bulho atingido pela infecção (...) A paralisia tomara todo o corpo de Ruy Barbosa. A agonia foi rápida. Às 8,25 morriaplacidamente." Rio Jornal, 2 de março de 1923.

"Apagou-se ontem a grande vida de Ruy Barbosa. Não se grafa esta frase friamente. Certos embora da condição extremamente delicada da sua saúde, preparados para a dureza do golpe que, de ha muito, ameaçava essa luminosa existência, não soubemos afazer à brutal realidade do seu desaparecimento. Profundamente consternados diante da evidência sem remédio, não nos conformamos com a perda formidável, senão para sentirmos ainda com maior dor a incidência da cruel fatalidade.

Desmorona-se, com ele, o acume da mentalidade brasileira; perde a América o seu maior cidadão vivo, e o mundo civilizado uma das raras cerebrações potenciais que iluminam de peregrino esplendor contemporâneo a sua cultura política, jurídica e literária. (...)

Sessenta anos consumiu ele lutando por todas as causas dignas de um gênio de mil faces e de um coração nutrido pelo bálsamo da mais alta generosidade. (...)

De uma vida tão opulenta, vivida com tamanho fausto e glória, baldado seria tentar mesmo uma síntese, com a pretensão de fixar nos seus lineamentos mais típicos e uma obra nos seus aspectos mais sensíveis. Falece-nos o engenho ante a sombra do gigante. Não temos senão ânimo para pranteal-o, e participar do luto que assombra a alma inconsolável da Pátria. (...)" O Paiz, 2 de março de 1923.

"Os genios escapam à precacidade das coisas humanas. A imortalidade só para eles não é uma palavra vã, porque só eles podem viver, pela irradiação eterna da sua luz, para além do perecimento da forma material em que se abrigaram. Por isso, a morte, que nos arrebatou ontem Ruy Barbosa, não n'o matou. Ele sobreviverá à fatalidade das leis que presidem os destinos hymanos e o seu grande espírito, que anda todo esparso na sua grande obra, viverá conosco e viverá com a história pelos tempos adentro. (...)

Revelou-se sobretudo na memorável campanha civilista que agitou o país em 1909 e 1910. São imortais - pode-se dizer - os discursos e conferências que fez no Teatro Lyrico, da Bahia, em S. Paulo, em Campinas, em Santos, em Belo Horizonte, em Ouro Preto, em Juiz de Fora, a Plataforma do Polytheama Bahiano e os manifestos à Nação.

É sem dúvida, a grande obra de Ruy Barbosa, a "República" ao professor Carneiro. É o Ruy polemista, entre amargo e agressivo, gramático e estilista. É outro trabalho de fôlego do ilustre morto a revisão do Código Civil, mil e oitocentos artigos, com longas e minuciosas notas. Como consequência dele, nasceu a réplica. As duas obras se completam em perfeição. (...)

Será transportado hoje, ao meio dia, para esta Capital o corpo do eminente brasileiro. (...)" O Brasil, 2 de março de 1923.

AS MANCHETES

A Morte do Gênio da Raça - Ruy Barbosa Faleceu, Ontem, em Petrópolis, Às 8,25 da Noite (A Pátria)

Ruy Barbosa - Clarão Extinto (O Paiz)

O Eclipse de um Gênio (Rio Jornal)

Um Golpe Irreparável do Destino . Morreu Ruy Barbosa - Homenagens e Tributos de Gratidão da Alma Nacional (A Tribuna)

Finou-se O Expoente Máximo da Intelectualidade Brasileira - O Páis Inteiro Chora, Neste Momento, A Morte de Ruy Barbosa, O Maior De Seus Filhos
Foi Decretado Pelo Governo Luto Nacional Por 3 Dias - Serão Prestadas Ao Grande Morto Honras de Chefe de Estado, Correndo As Despezas Dos Seus Funerais Por Conta da Nação. (O Brasil)


Página inicial