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LIMA BARRETO
Ano: 1922

"Morreu Lima Barreto; esta expressão laconica tem uma grande significação nos meios cultos de nosso paiz, principalmente nesta capital. É uma intelligencia robusta que se extingue, um romancista de temperamento singular que desapparece, justamente na edade em que as faculdades creadoras mais se accentuam e definem o literato, o artista, o psychologo: 42 annos de vida. (...)

Era um romancista de indole; se se pudesse determinar a escola a que se filiára mister era também dizer que elle mesmo, na sua visão minuciosa, na sua observação penetrante, fizera a sua propria escola; deixara-se nortear á mercê de sua imaginação fecunda e facunda. Lima Barreto, dizem-no os que sobre as suas obras fizeram juizos criticos, teria sido o maior romancista do seu tempo, se nas suas producções não revelasse as caracteristicas do seu "eu" artistico, a physionomia de sua propria individualidade, um superior desinteresse para os preciosismos sociaes, um descuidado desalinho, em que o seu genio creador, com uma malheabilidade prodigiosa, amoldava e distendia o typo e as sociedades dos seus romances.

Lima Barreto deixa as seguintes obras impressas: "Triste Fim de Polycarpo Quaresma", "Vida e Morte de J. M. Gonzaga de Sá", "Numa e Nympha", "Memorias do Escrivão Isaias Caminha", "Sonhos e Contos", "Farras e Mafuás", "Uma Provincia da Bruzundanga", as duas ultimas na livraria Schettino.

"O Cemitério dos Vivos", obra que começou a escrever, quando, por doença, recolheu-se ao Hospício, Lima Barreto não pôde concluir; a sua saude abalada o impediu.

Collaborou em varios jornaes e revistas desta capital, mesmo doente e abatido. (...)

Ha tres dias recolhera-se á casa e não mais saira. Ante-hontem, ás 5 horas da tarde, uma de suas irmãs, em obediencia ás prescripções médicas, penetrára em seu quarto para dar-lhe uma colher de remedio; achou-o em estado de agonia. A familia pediu a Assistencia, que já o encontrou morto.

Assim, morreu o filho extremoso, que, no arranco ultimo, teve ainda forças para conter-se numa sublime mudez, a fim de não causar dissabor ao pae, seu grande amigo. (...) - O Jornal, 3 de novembro de 1922.

"Á ultima hora, quando já se achavam quasi encerradas os trabalhos nesta redacção, surprehendidos com a dolorosa noticia do fallecimento de Lima Barreto.

Nada mais podemos dizer, senão que a morte do grande escriptor carioca abre na literatura nacional um vacuo diddicilmente preenchivel.

Lima Bareto era quasi uma tradição da cidade. O imprevisto e a hora do seu fallecimento não nos permittem, por ora, traçar notas mais completas sobre o grande vulto que se apaga.

Mas, nesta simples exclamação, de pasmo e de dôr, resumiremos, sem duvida, toda a magua que enche, neste momento, as rodas intellectuaes e bohemias da cidade: Morreu Lima Barreto!" - O Imparcial, 2 de novembro de 1922.

"- O corpo vae para o S. João Baptista? - interrogou uma mulher de apparencia modesta e ar compungido.

- Vae. É lá que elle sempre disse que desejava ser enterrado.

Estavamos na casa de Lima Barreto, na estação da Piedade.

Gente boa da visinhança cercava o esquife do romancista. Á porta, um grupo curioso de crianças olhava com attenção os que entravam, medindo todas as coisas com interesse e admiração.

A terde cinzenta e chuvosa tinha uma expressão vaga de humildade infinita, como se sobre ella pairasse invisivel e terna, a alma humilde de Lima Barreto...

Poucas flores. Grupos silenciosos e meditativos enchiam a pequenina sala, onde dormia, em seu leito final, o romancista bohemio dos nossos suburbios. Figuras do povo, dessas que a gente encontra a cada instante pelas ruas, anonymas em sua modestia trabalhadora e honrada, fitavam enternecidas o corpo inanimado de Lima Barreto, como que se despedindo de um companheiro querido, de um amigo, de um irmão...

Depois, o caixão se fechava sobre a physionomia impassivel do morto. As janellas visinhas se enchiam de rostos curiosos, e o enterro saia.

Breve, o rodar do trem, rumo á Central. Mais alguns instantes, e o cortejo pequenito e pobre demandava o aristocratico recolhimento de S. João Baptista.

E foi assim que, na tarde de hontem, desceu ao tumulo o corpo de Lima Barreto. (...)" O Imparcial, 3 de novembro de 1922.

"A nota dolorosa destas ultimas horas foi a morte de Lima Barreto, o maior romancista da sua geração.

Escriptor singular e brilhante, Lima Barreto possuia a mesma alma cheia de colorido e vivacidade, por vezes radiosamente alegre, por vezes triste, desta tumultuaria e formosa metropole em que nasceu ha quarenta e dois annos, e onde viveu as horas bizarras, amargas ou gloriosas de sua existencia movimentada de bohemio e de artista.

Chronista admiravel, jornalista notavel, tendo collaborado em varios jornaes dos Estados e desta capital, o autor das Memórias do Escrivão Isaias Caminha, deixa, sem duvida, uma obra profundamente humana, a qual, embora incompleta, ficará bella e eterna em meio da literatura nacional.

O desapparecimento do intenso e forte escriptor provocou no espirito dos que com elle conviviam, ou simplesmente o leram, um sentimento de saudade imperecivel. Essa saudade já se traduz, no coração de seus amigos mais dilectos, pela idéa de lhe erigirem um mausoléo no cemitério S. João Baptista, onde foi sepultado, sob a tarde humida e chuvosa de hontem, tendo o ataude, transportado em vagão funebre, ligado ao trem de suburbios, chegado á Central ás 17 horas e um quarto, vindo da estação de Todos os Santos, da rua Major Mascarenhas, residencia do romancista, á qual affluiram, ao saber da infausta nova, os amigos, varios representantes da imprensa carioca, e até gente do povo, desconhecida inteiramente, mas chorando o desapparecimento daquella alma bonissima. (...)" - O Paiz, 3 de novembro de 1922.

"Morreu, pela madrugada de hontem, o romancista Lima Barreto. Esse escriptor nascera em 1881, contando, portanto, 41 annos de edade.

Nascera nesta cidade e aqui mesmo se diplomara em engenheiro geographo, pela Escola Polytechnica. Submettendo-se a concurso, em 1904, foi nomeado funccionario do Ministerio da Guerra.

Lima Barreto, como todo mundo sabe, passou a vida na mais incorrigivel das bohemias. Essa forma de viver terminou por lhe abalar fundamente a saude, affectando-lhe differentes orgãos. Ultimamente os seus males se aggravaram, vindo o jornalista e literato a fallecer pela madrugada de hontem.

O romancista deixa varias obras publicadas, alem de algumas ineditas.

Lima Barreto foi enterrado, hontem, á tarde no cemitério de S. João Baptista." Correio da Manhã, 3 de novembro de 1922.

"Falleceu em sua residencia, á rua Major Mascarenhas, estação da Piedade, onde vivia ha muitos annos, um dos nossos mais festejados escriptores, Lima Barreto. Esse passamento, alías esperado, pois que, de havia mezes, elle apresentava serios symptomas de grave enfermidade, a que concorria a sua indole irreprimivelmente bohemia, veiu estremunhar numa dolorosa surpresa todo o nosso mundo mrntal, que via em Lima Barreto o verdadeiro escriptor typico do nosso povo, o impressionista admiravel da vida deste Rio de Janeiro, onde elle nasceu e de onde nunca saiu, o psychologo carregado e amargo das nossas ruas, dos nossos bairros pobres e de certos typos victoriosos e dominadores do nosso meio, que eram retalhados em complascencia pela sua ironia acre. (...)

Entre as obras mais populares e mais vibrantes, pelo colorido forte da verdade que soe illuminar as paginas deste escriptor, está o "Triste Fim de Polycarpo Quaresma", de que reproduzimos, abaixo, um trecho lapidar, em toda a irregularidade que constituia uma das caracteristicas desse impressionante tecelão de romances vivos.

Lima Barreto escreveu ainda: "Numa e Nympha", novella de grande sucesso escripta especialmente para "A Noite", que a publicou, ha alguns annos; "Memorias do Escrivão Isaias Caminha", em que ha criticas acerbas e desopilantes do nosso jornalismo; "Vida e Morte de J. M. Gonzaga e Sá", "Sonhos e Contos", e, ainda ineditos, "Uma Provincia da Bruzundanga" e "Farras e Mafuás", livros cheios das mais interessantes observações acerca da vida popular e politica desta gente com quem elle conviveu. Ha ahi quadros inesqueciveis que retratam a vida suburbana e a lufa-lufa das nossas baixas camadas sociais.

Com o seu desaparecimento material, Lima Barreto encetará, por certo, uma nova existencia de gloria e de prestigio no seio deste povo de que elle tanto escarneceu quanto amou. (...) - A Noite, 2 de novembro de 1922.

AS MANCHETES

Lima Barreto A Sua Morte (O Jornal)

Morreu Lima Barreto (O Imparcial)

A Morte de Lima Barreto (Correio da Manhã)

Lima Barreto - A Morte Desse Observador Admiravel Da Vida Do Nosso Rio De Janeiro (A Noite)


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