São Paulo, sexta, 1 de janeiro de 1999

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Precisão de contar as horas desafia a humanidade
Medição do tempo acompanha a história

RICARDO BONALUME NETO
especial para a Folha

O tempo passa de modo igual para todos os seres humanos, mas a percepção dessa passagem varia. Minutos em uma cadeira de dentista parecem horas, horas ao lado de uma pessoa amada parecem minutos. A busca de uma maneira de medir objetivamente a passagem do tempo foi uma das primeiras necessidades do dia-a-dia, ou do "mês-a-mês", quando foram inventadas as primeiras civilizações.
O mais antigo método de medir a passagem do tempo data justamente dessa antiguidade remota: já em 3500 a.C. o ser humano anotava a passagem do dia e da noite com um relógio solar.
A criação do "gnômon" foi uma das mais importantes da hu-manidade, embora menos badalada do que a da roda ou a da televisão. Trata-se do ponteiro que marca a altura do Sol pela direção da sombra, na sua forma mais básica um pedaço de pau enfiado na terra. Isso foi possível porque o tempo pode ser medido pelo movimento da Terra em relação ao Sol e às estrelas.
O movimento aparente do Sol no céu é a forma mais básica de medir o tempo. "Aparente", porque hoje se sabe que é a Terra que gira em torno do Sol, e não o contrário, como queria a Igreja Católica, baseada na ciência teórica grega e na Bíblia.

Em busca da precisão
Em qualquer parte do planeta, o meio-dia acontece quando o Sol alcança sua maior altura no céu. Logo, o intervalo entre esses dois pontos "meridianos" é conhecido como "dia". O relógio solar e a sombra projetada pelo "gnômon" representaram a primeira forma de saber quando era a hora exata do almoço.
Já a divisão do dia em 24 horas é uma questão de costume, de definição prática. Poderia muito bem ser de 23 horas ou de 25 horas.
Além do relógio solar, a hu-manidade procurou outros meios de medir o intervalo de tempo, geralmente de forma mecânica -com um instrumento que medisse intervalos regulares. Nem sempre havia luz solar suficiente para projetar uma sombra num plano por meio do "gnômon".
É o caso da ampulheta, que se vale da passagem de uma quantidade de areia entre dois vasos de vidro.
A ampulheta é um excelente exemplo, pois revela alguns problemas típicos. É preciso virá-la uma vez terminada a areia, mas, mesmo que se consiga um meio automático de fazê-lo, há o desgaste do material e da própria areia. A imprecisão é intrínseca a esse meio de medição.
O mesmo vale para as clepsidras, relógios de água, nas quais o fluxo de água substitui a areia. Os gregos antigos inventaram modelos ex-tremamente complexos de relógios de água. Depois da clepsidra, os medidores de tempo passaram a usar contrapesos em vez de água.
Se, de um lado, o problema era criar um medidor que escapasse dessas dificuldades próprias, como o atrito e o desgaste, do outro está a própria natureza criando dificuldades.
A duração do dia não é a mesma ao longo do ano, pois o movimento aparente do Sol também varia com as estações.
Se isso já atrapalha um pouco as medições feitas por meio de instrumentos toscos, quando começaram a surgir aparelhos capazes de checar os intervalos de tempo com maior precisão foi necessário calcular um tempo "médio" solar.
Já no século 14 da era cristã começam a surgir relógios mecânicos, com alguns princípios básicos que permanecem até hoje -molas, rodas dentadas e ponteiros.
É preciso que o relógio tenha uma força capaz de fazer seu mecanismo entrar em ação, conservando e liberando a energia no processo. Com uma mola, é possível "dar corda" e produzir essa força. Nos relógios de pulso modernos, basta o movimento do braço para essa mola automaticamente "se dar corda". Também se pode fazê-lo com uma corrente elétrica.
Um melhoramento fundamental foi o pêndulo, com sua propriedade de balançar com periodicidade regular. O holandês Christiaan Huygens (1629-1695) mostrou como o pêndulo podia ser usado para tornar um relógio mais preciso.
Com o aumento da precisão dos relógios e a invenção dos chamados "cronômetros", foi possível facilitar em muito a vida dos navegadores, ajudando-os a se posicionar com maior certeza no oceano.
O primeiro cronômetro náutico bem-sucedido foi feito pelo britânico John Harrison (1693-1776). Seu segredo foi usar diferentes metais no cronômetro, compensando a distorção trazida pela variação de temperatura.
Desde então, surgiram inovações que melhoraram em muito a precisão, como o relógio de quartzo, surgido em 1929 nos EUA.
As vibrações desse cristal, submetido a uma corrente elétrica, são muito precisas, em certos casos com precisão equivalente a um erro de um segundo a cada dez anos.
O último desenvolvimento tecnológico foi ainda mais além. Os relógios atômicos -surgidos em 1955 no Reino Unido- são os mais precisos de todos, pois as vibrações que servem para medir os intervalos de tempo são as dos estados energéticos de determinados átomos, e portanto não são afetadas por forças externas.
Graças ao relógio atômico utilizando o elemento químico césio, foi possível definir de uma vez por todas a duração padrão de um segundo, em uma conferência internacional em 1967.

Relógios mais baratos
Agora que o ser humano conseguiu aproveitar um fenômeno natural em escala atômica para aumentar a precisão dos relógios, dificilmente se fará ainda algum avanço revolucionário nessa área. Em compensação, os relógios para uso doméstico continuam sendo aperfeiçoados, e seu uso disseminado à medida que ficam mais ba-ratos.
Relógios com mostradores de cristal líquido, por exemplo, eram caros e raros quando surgiram, mas hoje são comuns.
Novos materiais, como ligas metálicas aperfeiçoadas ou materiais plásticos, e novas formas de energia, como a luz do Sol, tendem cada vez mais a melhorar a precisão e a confiabilidade dos relógios para uso doméstico.



Texto Anterior | Próximo Texto | Índice



Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita do Universo Online ou do detentor do copyright.