São Paulo, segunda-feira, 03 de dezembro de 2001

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PARANÁ

Documentos reforçam veracidade do financiamento paralelo da reeleição de Cassio Taniguchi no ano passado

Aparecem originais do caixa dois do PFL

FERNANDO RODRIGUES
ENVIADO ESPECIAL A CURITIBA

Papéis originais que pertencem à contabilidade da campanha do PFL para a Prefeitura de Curitiba em 2000 reforçam os indícios de veracidade do livro-caixa secreto usado pelo partido.
A Folha obteve 28 documentos que juntos mencionam pagamentos de pelo menos R$ 1.777.784,41. Há alguns papéis com valores mais altos, mas não é possível determinar com precisão a que as anotações se referem.
Do R$ 1,777 milhão mencionado em parte dos 28 documentos, só R$ 285 mil aparecem descritos na contabilidade entregue pelo PFL ao TRE (Tribunal Regional Eleitoral) do Paraná.
Esses papéis originais contêm assinaturas que seriam de pessoas e empresas que participaram da campanha da reeleição de Cassio Taniguchi para prefeito de Curitiba no ano passado.
O Ministério Público do Estado do Paraná convocará nos próximos dias todos os envolvidos. Será realizada perícia para verificar se as assinaturas são autênticas.
A coligação liderada pelo PFL, Movimento Curitiba Sempre com Você, que reelegeu Taniguchi prefeito, declarou gastos de R$ 3,112 milhões em sua campanha em 2000. No dia 6 do mês passado, a Folha revelou que a despesa total havia sido de R$ 32,9 milhões, segundo anotações de um livro-caixa manuscrito. Uma diferença de R$ 29,8 milhões não teria sido declarada à Justiça Eleitoral.
Ao comentar os novos papéis originais obtidos pela Folha, o procurador de Justiça do Estado do Paraná, Munir Gazal, disse: "Como aparentemente esses papéis saíram do mesmo lugar de onde vieram outros poucos documentos originais que temos, é possível que tudo seja verdadeiro. Mas só poderemos, entretanto, afirmar isso com segurança após a perícia técnica. Se forem mesmo autênticos, esses documentos serão mais um elemento de prova importante no caso".
Até o momento havia apenas a confirmação oficial de quatro bilhetes originais que pertenciam ao caixa dois do PFL curitibano. São pequenos papéis nos quais o presidente do comitê financeiro, Mário Lopes Filho, dava instruções sobre pagamentos secretos. Ele negou a autenticidade dos documentos, mas sua versão foi derrubada por uma perícia feita pela Polícia Civil do Paraná.

Várias operações
A Folha teve acesso aos papéis que dão sustentação a esta reportagem há uma semana. Depois de uma checagem inicial, as pessoas e empresas cujos nomes aparecem nos documentos passaram a ser contatadas. Muitas se recusaram a falar (leia texto na página A7). Algumas confirmaram parcialmente o que estava contido na documentação.
Há várias operações. A mais comum é a do recibo informal para o partido com o valor total, e, depois, a declaração de um montante menor para o TRE. Seria o caso da Gráfica Mikito. Na Justiça Eleitoral, consta que essa empresa recebeu R$ 4.831 da campanha de Cassio Taniguchi. Em um recibo original secreto aparece, entretanto, o valor de R$ 142 mil.
Há casos em que nada é declarado ao TRE. Essa parece ser a situação de empresas como o instituto de pesquisas Brasmarket e a Toccafondi Camisetas e de pessoas físicas como Valdo Zanetti e Fernão Accioly. Há um recibo original no qual a Brasmarket aparece recebendo R$ 20 mil. A Toccafondi Camisetas tem um pagamento de R$ 14 mil. Valdo Zanetti e Fernão Accioly teriam recebido R$ 183.349 e R$ 20 mil, respectivamente. Nenhuma dessas pessoas e empresas está na lista oficial de fornecedores da campanha de Cassio Taniguchi.
Se forem confirmados esses pagamentos, essas empresas e pessoas não terão cometido nenhuma irregularidade se tiverem declarado as operações no Imposto de Renda. Mas o PFL e o prefeito Cassio Taniguchi terão cometido um ato ilegal ao não declararem as operações ao TRE.

Depósito bancário
Um caso está bem documentado. Trata-se de um recibo emitido pelo banco HSBC para um depósito, em dinheiro, no valor de R$ 80 mil na conta pessoal de um funcionário da agência de publicidade Lowe Loducca -que fez a campanha de Taniguchi em 2000 com o nome de Tarso Loducca, divisão criada com a finalidade de atender contas políticas.
Pela contabilidade oficial do PFL, a Tarso Loducca recebeu R$ 400 mil. A empresa coligada Loducca Virtual recebeu outros R$ 16.180 pela montagem do site de Taniguchi na internet.
Ocorre que esses valores foram pagos à Loducca nos meses de agosto, setembro e outubro de 2000, conforme os documentos oficiais do PFL. A agência, por intermédio de sua assessoria, confirmou que as datas são essas.
Já o depósito de R$ 80 mil, na conta de Nelson Soares da Graça, funcionário do departamento financeiro da Loducca, foi efetuado às 12h53 de 20 de dezembro de 2000. É, portanto, um pagamento adicional ao que foi dito ao TRE.
É possível que esse depósito faça parte do que teria sido o pagamento total do PFL à Loducca pela campanha de Taniguchi. Nos registros do caixa paralelo que está sendo investigado pelo Ministério Público, aparece um valor de R$ 1.501.200 pago à agência -R$ 1.085.020 a mais do que o declarado ao TRE.
Procurada, a Loducca não comentou o depósito de R$ 80 mil. Uma explicação que a Folha ouviu da assessoria de imprensa da Prefeitura de Curitiba é que, por ter sido em dinheiro, tratou-se de uma transferência interna na agência de publicidade.
Essa versão, entretanto, conflita com o que já existe de evidências dentro do caixa dois. Além de o recibo do depósito bancário ter sido encontrado dentro da contabilidade secreta do PFL, há um bilhete manuscrito de Mário Lopes Filho, presidente do comitê financeiro de Taniguchi, descrevendo a operação.
Nesse bilhete -original e dado como verdadeiro pela perícia técnica-, MLF escreveu: "Depósito HSBC SP R$ 80 M agência 1888 c/ c 0076-15 Tarso Loducca". Logo abaixo, o próprio Mário Lopes faz uma retificação de número de conta bancária: "c/c 0003076 Nelson Soares da Graça".
A Tarso Loducca hoje não existe mais. Paulo de Tarso, que era um dos sócios cujo nome figurava no nome da firma, presta agora serviços para o PSDB e para o presidente Fernando Henrique Cardoso, em Brasília.
Apesar das evidências já encontradas, o Ministério Público considera difícil obter provas para validar todo o caixa paralelo do PFL. Os papéis originais divulgados hoje devem se tornar a principal peça da investigação.



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