Reuters
07/10/2002 - 13h08

Coalizão do governo segue rumo ao colapso na Irlanda do Norte

da Reuters, em Belfast

O processo de paz da Irlanda do Norte enfrenta hoje sua crise mais profunda desde a assinatura do Acordo da Sexta Feira Santa, em 1998, após a revelação de uma suposta operação de espionagem do guerrilha católica IRA (Exército Republicano Irlandês), comparada por alguns ao escândalo Watergate.

As alegações de que o Exército Republicano Irlandês penetrou nos santuários internos do poder britânico na Província levaram os unionistas protestantes a pedir a expulsão do Sinn Fein, braço político do IRA, do governo local.

O assunto será debatido em Londres nos próximos dias, mas a atmosfera está cada vez mais quente em Belfast. Poucos esperam que o governo protestante-católico sobreviva à próxima semana.

Se a coalizão cair, Londres será forçada a assumir o governo da Irlanda do Norte. A maioria dos analistas não acredita na volta do IRA à guerra aberta, mas teme que os grupos violentos explorem o vácuo político.

"Isso é dez vezes pior que qualquer coisa que aconteceu em Watergate", disse o primeiro-ministro protestante da Província, David Trimble, hoje.

"Houve espionagem política em grande escala e, até onde podemos ver, a espionagem foi direcionada ao movimento republicano com o propósito de ajudar seus projetos políticos."



Na semana passada, a polícia invadiu o escritório do Sinn Fein no parlamento de Stormont, em Belfast. No domingo, Denis Donaldson, dirigente do partido, apareceu na corte acusado de ter documentos que provavelmente seriam usados por terroristas.

A ação policial aconteceu depois de um ano de investigações sobre acusações de que o IRA tinha um agente dentro do quartel-general de ministros britânicos em Belfast.

Políticos protestantes, comprometidos em manter os laços com o reino Unido, dizem que o IRA está claramente rompendo o cessar-fogo de 1997 e por isso seus aliados não podem participar do governo.

O Sinn Fein acusa os unionistas de se recusarem a compartilhar o poder com a minoria católica da Irlanda do Norte e que a ação da polícia teve o objetivo político de desacreditar os republicanos.

Trimble, líder do maior grupo protestante, o Partido Unionista do Ulster, se encontrará amanha com o primeiro-ministro britânico, Tony Blair, em Londres. Ele deverá exigir a exclusão do Sinn Fein do governo.

Uma fonte próxima do primeiro-ministro disse que ele e seus três ministros deixarão o executivo se não ficarem satisfeitos com a resposta britânica.

Próximo passo
De acordo com as regras na Irlanda do Norte, a atitude levará ao colapso das instituições autônomas estabelecidas no acordo da Sexta Feira Santa, feito para acabar com três década de violência que deixaram mais de 3.600 mortos.

Blair ou seu secretário para a Irlanda do Norte, John Reid, podem suspender a devolução para evitar o colapso das instituições, o que acabaria com a autonomia.

O porta-voz de Blair fez um apelo na segunda-feira contra uma "ação precipitada antes das discussões".

Mas, enquanto ele falava, Ian Paisley, político protestante linha-dura, aumentava a pressão em Belfast prometendo que seus dois ministros também deixariam o governo.

"O caminho marcado pelo acordo de Belfast foi infrutífero para os unionistas", disse.

Sinn Fein
O líder do Sinn Fein, Gerry Adams, que também se encontrará com Blair e Ahern nesta semana, acusou "elementos do sistema britânico" de tramarem para garantir que seu partido fosse culpado quando os unionistas desistissem de dar autonomia.

"Não vamos ser levados por hipérboles e exageros em tudo isso", disse ele à Sky News. "Foi uma peça de teatro político para tentar ligar o Sinn Fein ao que está acontecendo no nebuloso mundo da segurança britânica."

As instituições da Irlanda do Norte vêm passando de crise a crise desde que o poder foi transferido de Londres, em dezembro de 1999, mas tiveram apoio popular e ajudaram a atrair investimentos econômicos para a Província.

Ninguém acredita que a suspensão das instituições levaria a Província de volta ao derramamento de sangue de antes de 1994. Mas os conflitos nas ruas de Belfast e os ataques esporádicos de grupos armados lembram que a ameaça de violência grave continua real.

"O processo de paz tentava tirar o IRA da violência", disse James Dingley, professor de violência política e terrorismo na Universidade do Ulster. "Se os representantes do IRA não estiverem dentro, não há um processo de paz."

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