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03/10/2000
-
14h12
especial para a Folha de S.Paulo
"De tudo ao meu amor serei atento/ Antes e com tal zelo e sempre e tanto/ Que mesmo em face do maior encanto/ Dele se encante mais meu pensamento." Você já deve ter lido essa estrofe de famoso poema de Vinícius de Moraes. Note o efeito de estilo que o poeta consegue ao inverter a ordem usual das palavras (em ordem direta, teríamos: Serei atento ao meu amor antes de tudo).
No dia-a-dia, usando a linguagem apenas para a comunicação, tendemos a seguir a ordem direta de colocação, em que o sujeito antecede o verbo, e este, os complementos. Os substantivos costumam antepor-se aos adjetivos, uma vez que a estes cabe apenas caracterizá-los.
Ao descrevermos alguém, podemos dizer que tem olhos verdes, dificilmente diremos que tem "verdes olhos". Se o fizermos, chamaremos a atenção do ouvinte para a forma, não apenas para o conteúdo do que dissemos. A expressão "verdes olhos" diz mais que a cor dos olhos de alguém; manifesta afeto, envolvimento, a impressão subjetiva causada pelo verde dos olhos.
É interessante observar, porém, que, ao fazer o adjetivo preceder o substantivo, valorizamos o todo significativo, em detrimento do sentido de cada palavra. Em "verdes mares", o mar não é necessariamente verde, mas a expressão, em sua totalidade, tem o poder de evocar uma paisagem.
Esse tipo de recurso de estilo, no entanto, deve ser empregado com cautela. Há uma grande quantidade de séries usuais que se instalaram na linguagem corrente e já perderam sua força expressiva por conta da repetição.
Tornaram-se verdadeiros lugares-comuns, desprovidos, portanto, da intenção criativa, motivados pelo hábito ou mesmo pela preguiça.
Um grave acidente, uma vã esperança, um inspirado poeta, um nobre deputado, um sábio mestre, uma suave melodia e até as tórridas cenas de sexo são construções desbotadas pelo uso constante, não passam de clichês e, assim, devem ser evitadas por quem queira desenvolver um estilo próprio.
Tais expressões (entre muitas outras) podem ser revitalizadas em contextos humorísticos, momento em que farão sucesso.
Às vezes, o significado da palavra pode modificar-se em razão da posição que ocupa na frase. Não é difícil perceber a diferença entre um homem pobre e um pobre homem. Se ao primeiro faltam recursos financeiros, o segundo é objeto da compaixão alheia, vítima de algum percalço.
Pronomes indefinidos antepõem-se aos substantivos; se pospostos, podem perder o significado original (certo dia; dia certo; todo dia; dia todo).
Possessivos após os substantivos criam belos efeitos expressivos. Quem não se lembra de: "Quando a luz dos olhos meus...", de Tom e Vinícius?
Thaís Nicoleti de Camargo é consultora de língua portuguesa da Folha e apresentadora das aulas de gramática do programa "Vestibulando", da TV Cultura
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RESUMÃO/PORTUGUÊS: Ordem direta e ordem inversa
THAÍS NICOLETI DE CAMARGOespecial para a Folha de S.Paulo
"De tudo ao meu amor serei atento/ Antes e com tal zelo e sempre e tanto/ Que mesmo em face do maior encanto/ Dele se encante mais meu pensamento." Você já deve ter lido essa estrofe de famoso poema de Vinícius de Moraes. Note o efeito de estilo que o poeta consegue ao inverter a ordem usual das palavras (em ordem direta, teríamos: Serei atento ao meu amor antes de tudo).
No dia-a-dia, usando a linguagem apenas para a comunicação, tendemos a seguir a ordem direta de colocação, em que o sujeito antecede o verbo, e este, os complementos. Os substantivos costumam antepor-se aos adjetivos, uma vez que a estes cabe apenas caracterizá-los.
Ao descrevermos alguém, podemos dizer que tem olhos verdes, dificilmente diremos que tem "verdes olhos". Se o fizermos, chamaremos a atenção do ouvinte para a forma, não apenas para o conteúdo do que dissemos. A expressão "verdes olhos" diz mais que a cor dos olhos de alguém; manifesta afeto, envolvimento, a impressão subjetiva causada pelo verde dos olhos.
É interessante observar, porém, que, ao fazer o adjetivo preceder o substantivo, valorizamos o todo significativo, em detrimento do sentido de cada palavra. Em "verdes mares", o mar não é necessariamente verde, mas a expressão, em sua totalidade, tem o poder de evocar uma paisagem.
Esse tipo de recurso de estilo, no entanto, deve ser empregado com cautela. Há uma grande quantidade de séries usuais que se instalaram na linguagem corrente e já perderam sua força expressiva por conta da repetição.
Tornaram-se verdadeiros lugares-comuns, desprovidos, portanto, da intenção criativa, motivados pelo hábito ou mesmo pela preguiça.
Um grave acidente, uma vã esperança, um inspirado poeta, um nobre deputado, um sábio mestre, uma suave melodia e até as tórridas cenas de sexo são construções desbotadas pelo uso constante, não passam de clichês e, assim, devem ser evitadas por quem queira desenvolver um estilo próprio.
Tais expressões (entre muitas outras) podem ser revitalizadas em contextos humorísticos, momento em que farão sucesso.
Às vezes, o significado da palavra pode modificar-se em razão da posição que ocupa na frase. Não é difícil perceber a diferença entre um homem pobre e um pobre homem. Se ao primeiro faltam recursos financeiros, o segundo é objeto da compaixão alheia, vítima de algum percalço.
Pronomes indefinidos antepõem-se aos substantivos; se pospostos, podem perder o significado original (certo dia; dia certo; todo dia; dia todo).
Possessivos após os substantivos criam belos efeitos expressivos. Quem não se lembra de: "Quando a luz dos olhos meus...", de Tom e Vinícius?
Thaís Nicoleti de Camargo é consultora de língua portuguesa da Folha e apresentadora das aulas de gramática do programa "Vestibulando", da TV Cultura
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