LENITA
MIRANDA DE FIGUEIREDO
Ninguem
melhor do que Sam "Squashie", Manning, comico da fase revivalista
dos famosos "Ministral Show", para contar a historia de Marcus
Manasseh Garvey, o "Moisés Negro" do Harlem.
O
episodio em que se viu envolvido Garvey confunde-se sobremaneira
com a epoca em que o jazz tomava conta dos Estados Unidos, e transformava-se
na boa dos jazz-man da chamada primeira linha, em saborosa piada.
"Squashie",
com seu terno branco de linho curto, e sua inseparavel bengala,
arrancaria vaias da criançada nas ruas mas teria empolgado os
musicos da epoca com seu talento, e, principalmente, com a historia
musicada do "Moises Negro".
Foi
por volta de 1917, quando o Harlem florescia como um recanto encantado,
apesar das lutas segregacionistas e problemas economicos. As peças
musicais "Kikukor" e "Bassa Moone", escritas, representadas e
dirigidas por africanos, já havia enriquecido a vida cultural
da comunidade.
Duke
Ellington e Cab Calloway começariam a ganhar reputação como chefes
de orquestras e o pugilista Batting Siki, após derrotar o boxador
Georges Charpentier, embasbacaria Paris dentro de um poderoso
automovel, com um leão atrelado. Centenas de "Hong Tonks" prosperavam
e Bessie Smith estaria destinada a ser idolatrada pela raça negra.
Exatamente quando o ritmo da vida do Harlem parecia estar sendo
marcado pelo jazz, aconteceu.
Roi
Ottley, na sua obra sobre os negros da America, relata o aparecimento
e o fim de "Moises Negro". Mas há musicologos e sociologos que
põem a historia na boca de "Squashie" a fim de que alcance a verdadeira
dimensão anedotica dentro da sua veracidade.
Marcus
Manasseh Garvey, preto tempestuoso, nascido nas Indias Ocidentais,
criado em regime de casta de cor - brancos e negros e mulatos
- teria se ressentido e alimentado um odio surdo contra os mulatos.
Isto teria levado a fundar a "Universal Negro Improvement Association",
que pregava a volta dos homens negros à Afriea.
Feio,
baixo e gordo, de olhos inteligentes e cabeça grande, após liderar
a malfadada greve de tipografos, começou a pregar suas idéias
em grandes discursos para os vagabundos, de Lenox Avenue. O Harlem
ignorava suas pregações e o tachava de "imigrante" indesejavel.
Mas quando um louco entrou no seu quarto e o baleou, Marcus saiu
ensanguentado pela rua a correr e a gritar. A verdade é que o
fato tomou proporções heroicas. Em pouco tempo, Marcus liderava
nucleos negros até fazer do Harlem o seu quartel-general. Ali
construiu um barracão coberto de zinco, o "Liberty Hall", e começou
a editar "The Negro World" e a mobilizar a opinião publica através
de circulação mundial.
Sem
esmorecer nos seus propositos de fazer com que os negros retornassem
à Africa, fundou uma marinha mercante e batizou-a com o nome de
"Black Star Line", anunciando que a soma necessaria para a sua
capitalização seria de dez milhões de dolares. Após a venda de
ações anunciou a compra do primeiro navio chamado "Yarmouth" e
o rebatizou de "Frederik Douglas". Os negros empolgaram-se. Permaneciam
aos milhares nas margens do Hudson e até pagavam um dolar para
subir a bordo e apertar a mão da tripulação negra.
O
lançamento do navio foi algo de indescritivel, bandeirolas, especiarias,
culinarias, danças e jazz de primeira continuaram por muitos dias
mesmo quando o barco largou amarras e iniciou sua primeira viagem
sob as cores da "Black Star Line".
Com
um carregamento de quinhentas caixas de uisque caro que deveria
ser entregue em Cuba, o navio começou a afundar logo depois de
New-port News. Ottley conta que tiveram que jogar ao mar o uisque
para não afundar. Mas "Squashie" teria contado que a tripulação
resolvera beber todo o carregamento de uisque, uma vez que teria
de jogá-lo ao mar para evitar naufragio. E que depois de bebedeira,
é claro, caberia um bom jogo de dados, um lamento africano e uma
boa seção de jazz, enquanto o navio viajava ao sabor das ondas
por muitos dias.
A
história do jazz registrou "em varios blues", alem dos "Ministhel
show", essas passagens pitorescas da luta dos negros pela liberdade
e direitos humanos. Mas os proprios homens do jazz divertem-se
com a versão de "Squashie" e encontram sempre no velho tema um
motivo para fazer jazz.