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GOVERNO FHC OPTA POR TEORIA
E DEIXA O POVO COM FOME
"Nunca vi um faminto dizer que matar a fome é paternalismo"
Solução para falta de cesta básica só em 2001
DENISE MADUEÑO
articulista convidada
Brasília - 5.dez.2000 - O governo do presidente Fernando Henrique Cardoso acaba de deixar na mão a população de pelo menos 15 Estados que depende da cesta básica para sobreviver. Sem apresentar programa alternativo, o governo acabou com o projeto de distribuição de alimentos, chamado Prodea, com o argumento de que era "assistencialista".
É claro que ninguém pode concordar que distribuir alimentos é o melhor dos mundos. Além de humilhante, a situação pode ser uma porta aberta para a corrupção, o clientelismo político e outros tantos prejuízos perversos que podem vir da relação de dependência.
É óbvio que ter um emprego, poder comprar seu próprio alimento, ter escola, ter saúde, bate de longe. Mas essa é uma realidade distante para grande parcela da população no país.
Acabar com a distribuição de alimentos sem desenvolver uma política alternativa é contribuir para aumentar a miséria e piorar a saúde da população.
A sensação que dá é que as ações assistenciais do governo seguem sem rumo. Como se faltassem a determinação e o pragmatismo verificados na defesa do ajuste fiscal.
Em 1993, partiu de um sociólogo, como o presidente, a criação de um movimento que emocionou o país na tentativa de ocupar a lacuna que o governo insiste em não encarar.
Enfrentando críticas de companheiros de esquerda por causa de definições sobre assistencialismo como essa, Herbert de Souza, o Betinho, comandou um movimento contra a fome e a miséria que despertou a solidariedade no país e mostrou que ações emergenciais são necessárias quando vidas humanas estão em jogo.
"Nunca vi um faminto dizer que matar a fome é paternalismo", respondia Betinho, morto em agosto de 1997.
Soluções que melhoram a qualidade de vida existem, são conhecidas, foram testadas e mostraram que dão certo.
Em Brasília, em quatro anos de governo (1995-1998), Cristovam Buarque conseguiu mostrar que é viável a implantação do Bolsa-Escola. O programa virou referência mundial e é defendido agora por FHC em encontros internacionais.
O governo afirma que procura alternativas. Entre elas estaria a substituição da cesta básica justamente pelo Bolsa-Escola para as famílias com filhos em idade escolar (entre 7 e 14 anos). Nesse programa, o governo deve destinar R 38 em média por mês às famílias que provarem a permanência dos filhos nas escolas.
Outra alternativa seria incluir famílias com filhos fora da idade escolar (até 6 anos) em programas do Ministério da Saúde. Essas famílias teriam a ajuda do Estado em troca do acompanhamento da saúde das crianças.
Que façam mesmo o que prometem. Mas por que isso não foi adotado até agora? Por que o governo descobriu que distribuir alimentos é "assistencialismo" e procura soluções depois de seis anos de mandato?
No "Avança Brasil", o livro com os compromissos do presidente em sua campanha pela reeleição, a distribuição de alimentos é prioridade. Vale reproduzir aqui o que afirma o documento: "A persistência de focos de fome e miséria extrema no Brasil é motivo de vergonha e indignação. Isso vai acabar".
Até agora, no entanto, não há solução. Apesar de já ter sido extinto na prática em pelo menos 15 Estados, oficialmente o programa em todo o país acaba em janeiro, quando deixará de receber recursos.
O projeto era destinado a cerca de 8,6 milhões de pessoas que moram em bolsões de pobreza, assentamentos rurais e comunidades indígenas.
Até o mês passado, o governo havia liberado apenas 40% do previsto no Orçamento da União para este ano, R 100,5 milhões.
Para se ter uma idéia, os recursos gastos pelo governo em publicidade, apenas no primeiro semestre do ano, foram de R 92,5 milhões.
A normalização da distribuição de alimentos não será mais possível neste mês, mesmo com recursos extras que o governo promete liberar. A avaliação é da própria Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), responsável pela administração do programa.
Enquanto o governo discute ações efetivas e assistencialismo, haverá mais famílias sem o que comer no mês de dezembro.
Com certeza essa legião de famintos optaria em ter Betinho, com sua campanha pelo Natal sem Fome, à interminável discussão sobre assistencialismo.
Denise Madueño, é coordenadora de Política da Sucursal de Brasília da Folha de S.Paulo.
escreva para Denise Madueño: dmadueno@folhasp.com.br
Volta
Na próxima semana os internautas terão de volta as informações e os comentários de Fernando Rodrigues. Ele estará de volta nesta página a partir de terça-feira depois de merecidas férias.
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