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Desafio de Lula será montar base
confortável de apoio no Congresso


  • Troca-troca partidário será inédito antes da posse
  • Partidos aliados de Lula podem receber mais de 30 deputados

    Fernando Rodrigues

    BRASÍLIA - 06.jan.2003 - Factóides à parte, a grande missão do governo Lula nas próximas semanas, talvez meses, será construir uma maioria confortável no Congresso para governar sem crises.

    É um lugar comum afirmar que "governo é governo" e sempre consegue maioria no Brasil, pois os partidos parecem moluscos de tão invertebrados que são. Ocorre que todas as crises recentes na história da jovem democracia brasileira se deram por causa do apoio frágil de algum presidente da República no Congresso.

    Há indicações de que é verdadeira a intenção dos petistas de fazer um governo com uma taxa menor de fisiologismo e toma-lá-dá-cá, a praxe na política brasileira. Entre a intenção e a realidade há uma grande distância.

    De toda forma, o caminho foi escolhido. Um sinal foi deixar o PMDB de fora da Esplanada dos Ministérios. Não que o partido tenha um DNA 100% fisiológico. Mas como se trata de uma organização muito rachada, o governo petista acabaria tendo de dar mais cargos que o normal para contentar todas as alas dessa sigla.

    Antes de falar mais sobre essa que é a parte vital do governo Lula, vale a pena observar um fenômeno que está prestes a ocorrer, qual seja o da troca partidária dos deputados recém-eleitos. Os quadros abaixo dão uma noção do que está por vir:



    As possíveis bancadas de Lula na Câmara em 2003
    Partido resultado das urnas pior cenário para Lula melhor cenário para Lula
    PT 91 91 91
    PTB 26 32 38
    PL 26 36 43
    PSB 22 27 30
    PDT 21 21 21
    PPS 15 15 15
    PC do B 12 12 12
    PV 5 5 5
    PSD 4 4 4
    PST 3 3 3
    PMN 1 1 1
    PSL 1 1 1
    PSDC 1 1 1
    PFL 84 76 71
    PMDB 74 70 69
    PSDB 71 66 58
    PPB 49 45 43
    PSC 1 1 1
    Prona 6 6 6
           
    Total pró-Lula 228 249 265
    Total de oposição 278 257 241
    Total indefinidos 7 7 7
    Total geral 513 513 513
    Obs.: o PTB está em processo de fusão com o PSD

    Como é possível observar, os partidos aliados ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva teriam 228 deputados se fossem respeitados os resultados da eleição de 6.out.2002. É certo, entretanto, que terão mais do que isso. No pior cenário, serão 249 deputados lulistas. Na hipótese mais confortável, o número sobe para 265 votos na Câmara.

    É, evidentemente, um escândalo. Uma prova cabal de que as instituições partidárias no Brasil não merecem o nome que têm. Os deputados são donos de seus mandatos, não os partidos -muito menos os eleitores.

    Não vale dizer que o troca-troca partidário aconteceu também em governos anteriores, inclusive durante o governo FHC. Desta vez há uma aperfeiçoamento da operação: as trocas podem acontecer antes da posse dos congressistas.

    Em 1994 e em 1998 também ocorreram trocas antes das posses dos deputados (a eleição é sempre no primeiro domingo de outubro; a posse é no 1º de fevereiro seguinte, segundo regra constitucional). Nas outras ocasiões houve um certo pudor dos deputados por manter mais ou menos a configuração das bancadas que saíam das urnas.

    Agora, a mudança será muito grande. Mais de 30 deputados federais devem trocar de partido antes da posse. Um recorde histórico e a ser lamentado. O levantamento nas tabelas acima mostra que pode chegar a 37 o número de migrações partidárias nas próximas semanas.

    É necessário dizer que esse movimento migratório antes da posse é permitido pela lei. Um deputado que se elegeu por um partido pode assumir o mandato já por outra sigla em 1º de fevereiro. Os partidos que mais devem receber deputados são PTB, PL e PSB _siglas de médio porte que têm ministérios no governo de Lula.

    Os perdedores serão os partidos de oposição à administração petista, como PSDB, PFL e PPB. O PMDB, que não faz parte do governo Lula, também deve perder deputados.

    Mesmo com toda essa carnificina partidária, observa-se que Lula não terá maioria suficiente para aprovar uma emenda constitucional na Câmara -seriam necessários 308 votos.

    É possível, mas sempre incerto, que Lula obtenha os votos para suas reformas constitucionais nas bancadas de oposição (PSDB, PFL, PMDB e PPB). O problema é o calendário desfavorável para o petista.

    O Congresso está em recesso em janeiro. Toma posse em fevereiro para apenas eleger os novos presidentes das duas Casas, Câmara e Senado. Em março, começam de fato os trabalhos. Exatamente quando dezenas de categorias trabalhistas importantes no Brasil estarão ameaçando fazer greve se não tiverem gordos reajustes salariais (a inflação de 2002 ficou altíssima para os padrões do Real). Ao mesmo tempo, o Congresso estará em meio à mãe de todas as votações para o PT: o reajuste do salário mínimo.

    Como se não bastasse tudo isso, várias medidas provisórias estarão trancando a pauta. Pela regra atual, se uma MP não é aprovada ou rejeitada depois de um certo tempo, o Congresso tem de parar e votá-la. O PT estima que cerca de 10 a 15 MPs estarão trancando a pauta em março e abril. Deputados e senadores ficarão ocupados com isso, na melhor das hipóteses, até maio ou junho.

    Resumo da ópera: é possível que as reformas constitucionais só comecem a tramitar para valer no Congresso no segundo semestre. Exatamente quando, é lícito supor, a popularidade de Lula não estará no mesmo nível do atual.

    Com a popularidade menos brilhante sempre fica mais difícil obter apoios avulsos e descompromissados de deputados e senadores.

    É possível que Lula tenha popularidade suficiente durante o ano de 2003 inteiro para conseguir todo o apoio que precisa no Congresso. Mas isso não é certo e seria uma temeridade fazer tal vaticínio sem medo de errar.





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