Publicidade

 
UOL Business - Volta à página principal
 
  Entrevista


Sérgio Habib
"Perdemos dinheiro em cada carro produzido no país"
O lançamento de um produto é sempre motivo de festa para a empresa que faz o anúncio, certo? Nem sempre. Prestes a lançar oficialmente seu segundo carro "made in Brazil" - o C3, um compacto de estilo jovial, que vai concorrer com o Pólo e o Meriva -, a montadora francesa Citroën ainda tenta assimilar o impacto da alta do dólar em seus negócios.

A perda cambial fez com que o preço do C3 extrapolasse as mais pessimistas projeções da Citroën. A versão básica do C3, que deve chegar às concessionárias no início de junho, custará cerca de 35 mil reais - bem mais que o previsto pela empresa na ocasião em que o projeto foi traçado. Por essas e outras, a própria Citroën prevê prejuízo com a venda de cada carro produzido no país.

Apesar disso, em entrevista concedida ao UOL Business pessoalmente e por e-mail, Sérgio Habib, o presidente da Citroën do Brasil, fala em aumentar a participação da marca no mercado.

 
Foto: Ivan Luis Gomes
Foto: Ivan Luis Gomes
Foto: Ivan Luis Gomes
Mais informações sobre:
- O entrevistado
- A empresa
- O segmento
UOL Business - Pode-se dizer que se a decisão de produção do C3 fosse tomada hoje a Citroën não o faria?
Sérgio Habib - Se a decisão de investimento fosse hoje, a Citroën não lançaria o C3 no Brasil. Certamente esperaríamos mais um pouco. Com o atual nível do dólar, o C3 dá prejuízo, perdemos dinheiro em cada carro produzido no país. Mas o que acontece: o projeto já existe há um ano, quando o dólar valia 1,80 real. Agora, qualquer que seja a taxa cambial, a Citroën vai lançar o carro.

UOL Business - Isso significa que a Citroën vai pensar duas vezes no lançamento de futuros carros produzidos no Brasil?
Habib - Com certeza. A indústria automobilística trabalha sempre com prazos longos. Veja o exemplo do C3: você decide fazer um projeto e calcula toda sua rentabilidade com dólar cotado a 2 reais. Na época, o dólar estava em torno de 1,80 real. Quando você decide lançar o carro, o dólar está sendo vendido a 3,50 reais. Detalhe: não teve inflação, ou seja, é perda cambial mesmo. O resultado disso é que o projeto inteiro perde rentabilidade.

UOL Business - A Citroën já exporta para outros países?
Habib - A PSA (holding do grupo Citroën e Peugeot) exporta atualmente o Xsara Picasso para os países do Mercosul, Colômbia e África do Sul. Também estamos analisando a possibilidade de iniciar exportações para o México em 2004.

UOL Business - Como a guerra no Iraque afeta os negócios da Citroën?
Habib - O fato de a guerra ser muito recente pode nos levar a uma avaliação precipitada. É preciso aguardar um pouco mais a evolução do conflito para melhor entender suas conseqüências nos negócios.

UOL Business - A Citroën pensa em sair do Brasil ou fazer alguma fusão com outra montadora?
Habib - Não, pelo contrário. A recompra da participação acionária do Governo do Rio de Janeiro na fábrica de Porto Real pela PSA, realizada no ano passado, é um sinal de que não estamos pensando nisso. A PSA sabe exatamente o que é uma fusão - também já passou pela fusão da Peugeot com a Citroën e mais tarde com a Chrysler na Europa - e não quer mais.

UOL Business - O processo de fusão é assim tão traumático?
Habib - É muito difícil você conseguir uma fusão com sucesso. São culturas empresariais completamente diferentes. Quer exemplos? O livro do que você não deve fazer numa fusão é o que a Mercedes fez com a Chrysler. Já a união da Renault com a Nissan, pelo menos por enquanto, está funcionando bem. No caso da PSA, o casamento da Peugeot com a Citroën levou 20 anos para funcionar. A fusão foi em 1972, mas só se completou para valer em 1992. Ainda hoje a Citroën é muito diferente da Peugeot. São empresas com tradições empresariais completamente diferentes.

UOL Business - O Brasil saiu de quatro grandes montadoras para cerca de 20 em poucos anos. Na sua opinião, existe mercado para tantas empresas?
Habib - Não. Mas uma vez que uma montadora entra num mercado como o Brasil, faz investimentos, constrói uma fábrica etc., ela não vai mais embora. O que pode acontecer é ela ter de reduzir os investimentos ou se limitar a manter as operações para diminuir o prejuízo. Todas as montadoras decidiram vir para o Brasil quando o mercado brasileiro era de 1,9 milhão de carros e tinha um histórico de crescimento. Mas aí vieram as crises: a asiática, em 1997, a russa, em 1998, a brasileira, em 1999, a argentina, em 2001. Conclusão: já faz cinco anos que o mercado não cresce, que está oscilando entre 1,2 milhão e 1,5 milhão.

UOL Business - Apesar desse cenário dos últimos anos não ter sido tão bom quanto vocês imaginavam, qual a previsão da Citroën para os próximos anos?
Habib - A meta é dobrar a participação da Citroën com o C3 em 2004. Hoje temos 1,5% do mercado brasileiro, mas queremos fechar 2003 com 1,8%, chegando a 3% em 2004. Em 2002, foram vendidos 20 mil carros, 16 mil deles produzidos no Brasil. Para este ano, a idéia é comercializar 26 mil carros, cerca de 23 mil nacionais. Vale lembrar que o C3, assim como o Xsara Picasso, é montado e fabricado no Brasil, mas 45% a 50% dos componentes são importados. Daí a relevância do dólar na composição do preço final do carro.

UOL Business - Quantas concessionárias a Citroën tem atualmente no país? Há intenções de ampliar essa rede?
Habib - A rede Citroën hoje tem 56 concessionárias. Nossa idéia é chegar a 65 no final deste ano e a 90 lojas no início de 2005.

UOL Business - Qual a expectativa da Citroën com relação à aceitação do público para o C3?
Habib - Nossa expectativa é boa. O C3 é um carro que está vendendo muito bem na Itália, e o consumidor brasileiro é muito parecido com o consumidor italiano. O brasileiro é bem latino no seu gosto. Ele curte o carro, aprecia um carro bonito, estiloso, jovial. E o C3 é assim.