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  Entrevista


Jaime Cohen Szulc
Kodak quer crescer em áreas que ainda não são lucrativas
A Kodak vive hoje um dos momentos de maior transformação de sua história. E não poderia ser diferente. Não bastasse a crise econômica mundial iniciada em 2000 e a conseqüente queda de preços - que fizeram com que as vendas da multinacional americana caíssem nos últimos anos -, a Kodak tem enfrentado dificuldades de lucratividade em razão do avanço da fotografia digital, principalmente em mercados como Estados Unidos, Europa Ocidental e Japão.

Para adequar seus negócios à nova realidade, a Kodak decidiu adotar metas agressivas de redução de custos. O processo de reestruturação envolve, entre outras ações, a demissão de 6 mil funcionários em todo o mundo, o equivalente a 9% da força de trabalho da companhia, e a fusão das divisões de consumo e profissional.

Em entrevista ao UOL Business, o brasileiro Jaime Cohen Szulc - que até então respondia pela divisão de consumo na América Latina e agora também tem sob seu comando as operações da Kodak nos EUA e no Canadá - comentou a estratégia da companhia para crescer no mercado de fotografia. "O objetivo da Kodak não é aumentar a fotografia digital ou a fotografia tradicional, e sim fazer com que as pessoas tirem mais fotos, façam mais uso de suas fotos, independentemente do meio." O executivo também falou sobre os projetos da empresa para crescer em áreas que ainda não são lucrativas. "Temos vários projetos, entre eles um envolvendo o display Oled", revela Cohen, referindo-se à tecnologia desenvolvida pela Kodak para a produção de visores que permitem maior nitidez das imagens e menor consumo de energia que os displays convencionais.

 
Foto: Daniela Picoral
Foto: Daniela Picoral
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UOL Business - Como é assumir esse novo cargo no momento em que a empresa passa por uma reestruturação?
Jaime Cohen Szulc
- Muitas pessoas vêem a reestruturação de uma empresa como um aspecto negativo, porque envolve demissões, uma mudança na maneira como você gerencia a companhia. Mas isso não deveria ser novidade, especialmente para quem está observando o mercado. A IBM, por exemplo, passou por uma transformação gigante, de vender mainframes, para vender não só computadores pessoais como também serviços. A própria Kodak já se reinventou na área médica. Há 2 anos e meio, tivemos problemas de lucratividade nessa área, mas hoje ela é uma estrela dentro da companhia. Trata-se, portanto, de uma adequação de negócios.

UOL Business - Ao que você atribui essa necessidade de adequação de negócios?
Cohen
- Existem três motivos. O primeiro é a recessão mundial. A Kodak foi uma das primeiras companhias a anunciar, em 2000, que estava chegando uma recessão. E essa recessão, que ainda não foi embora, afeta indústrias como a nossa, porque para sustentar essas grandes plantas é preciso ter volume. O que acontece é que muitas empresas menores que a Kodak acabam baixando os preços para tentar conseguir mais volume. Com isso, a Kodak tem de baixar o preço também. Mas o mercado todo acaba perdendo porque a redução de preços não é tão significativa a ponto de afetar o consumo, mas é significativa para a empresa, porque existe uma queda de rentabilidade das companhias. O terceiro fator é que, nos EUA, na Europa Ocidental e no Japão, estamos passando por um momento de aceleração da penetração da fotografia gerada digitalmente. Há dois anos, a curva de penetração da fotografia digital era muito modesta, mas hoje ela está muito próxima da curva de adoção de videocassete, que é muito acelerada. A Kodak já previa isso e agora chegou o momento de fazer as mudanças que estavam sendo analisadas.

UOL Business - Que mudanças são essas?
Cohen
- Uma delas é a junção da unidade de negócios profissional com a unidade de consumo. Vamos manter o foco no fotógrafo profissional, mas ao mesmo tempo queremos usar a sinergia dos programas de marketing, das pessoas e dos negócios das duas áreas. Por outro lado, vamos continuar com uma área só para digital, porque ainda não existe uma penetração assim tão grande que justifique juntar isso tudo. Outra mudança na Kodak é união dos negócios da América Latina com EUA e Canadá. Apesar das dificuldades da AL, a região teve o melhor resultado relativo no mundo. E já faz 19 meses que entregamos nossos objetivos de lucratividade.

UOL Business - Isso justifica um pouco sua promoção?
Cohen
- Sim. A AL sempre foi olhada com carinho pela Kodak, mas o fato de nesse 1 ano e meio a gente ter conseguido recordes em várias áreas, como gerenciamento de fluxo de caixa, reforçou ainda mais. Então, com a decisão de unir o gerenciamento de negócios dessas regiões, estamos fechando o escritório que tínhamos em Miami e levando para Atlanta, onde fica o escritório central da Kodak. Com isso, além de ficar mais perto das pessoas que gerenciam EUA e Canadá, vamos aproveitar das sinergias e reduzir custos.

UOL Business - Quando vocês esperam finalizar essa reestruturação?
Cohen
- Temos um plano diretor estratégico que vai até 2006 e metas para 2010, mas temos ações de redução de custos que vamos implementar já, até dezembro, e depois, numa segunda onda, até março de 2004. A estratégia que vamos anunciar em setembro vai ajudar a Kodak a crescer também em áreas que ainda não são lucrativas. Temos vários projetos, entre eles um envolvendo o display Oled [Organic light emitting diode]. Quem é que não quer ter uma tela no computador ou na televisão que gaste menos energia e ofereça uma visão muito melhor? Esse é um projeto que ainda está nascendo na Kodak.

UOL Business - Qual a importância do Brasil para a Kodak mundial?
Cohen
- Dentro da AL, o Brasil sempre foi o país com maior volume de vendas. Há 2, 3 anos, também era o país com maior faturamento, mas por conta da desvalorização do real, o México assumiu a primeira posição. A situação do câmbio no Brasil faz com que tenhamos uma cautela maior na área de investimentos e no gerenciamento do país, mas a importância do Brasil não muda pelo potencial que ele oferece.

UOL Business - Foi essa cautela que fez com que o Brasil "perdesse" para o México a produção de filmes de 35 mm, que antes eram fabricados nos EUA?
Cohen
- Não, isso tem a ver com o gerenciamento logístico da Kodak. Como temos plantas espalhadas pelo mundo, temos de pensar qual é a melhor maneira de entregar o produto mais barato com a rapidez possível aos mercados do mundo inteiro. Daí a existência de centrais de produção. E o México é uma central de produção muito importante na área de câmeras de uso único, de 35 mm. O Brasil, por sua vez, é um pólo importante em produção de papel fotográfico.

UOL Business - Então essa decisão deve-se ao fato de o México já ter uma operação nessa área?
Cohen
- Exatamente. Eu conheço muitas indústrias que, devido à crise da Argentina, decidiram transferir parte da produção fabril para lá, para tirar vantagem do câmbio, da mão-de-obra mais barata etc. Essas são aproximações oportunistas ao negócio, que podem fazer sentido em algumas empresas, mas não para a Kodak. Nossas decisões nas áreas de manufatura e logística são tomadas, na vasta maioria, com base no longo prazo.

UOL Business - Mas a Kodak já fabricou câmeras no Brasil e hoje não produz mais.
Cohen
- Sim, mas essa também foi uma decisão para reduzir custos, oferecer um melhor preço para o consumidor, sempre com base no longo prazo. Tanto é que, como vendíamos uma quantidade importante no país, tivemos de ficar um tempo fora do mercado, porque a taxação de importação encareceu muito o produto.

UOL Business - Hoje quem abastece o Brasil?
Cohen
- Até o ano passado era a China, mas a partir deste ano inauguramos um local de montagem de câmeras no Brasil. Com isso conseguimos reduzir nossos custos e baratear o preço das câmeras, o que fez com que, nos últimos três meses, tivéssemos um recorde de vendas de câmeras no Brasil.

UOL Business - O que a Kodak tem feito para motivar o uso da fotografia digital?
Cohen
- O objetivo da Kodak não é aumentar a fotografia digital ou a fotografia tradicional, e sim fazer com que as pessoas tirem mais fotos, façam mais uso de suas fotos, independentemente do meio. Existem três coisas diferentes: como você captura uma foto, o que você faz com ela e, nesse contexto, quais são os meios. Onde você vai fazer e como você vai fazer, para nós não importa. O que queremos é democratizar a fotografia, criando condições para que o consumidor tenha acesso a essas possibilidades.

UOL Business - Então você não acredita que a fotografia convencional vá morrer logo?
Cohen
- Não. Em mercados como EUA, Japão e Europa Ocidental, 87% das pessoas que têm uma câmera digital usam tanto a foto digital quanto a tradicional, ou seja, elas não deixaram de usar a convencional. Obviamente com o barateamento das câmeras digitais isso pode mudar, mas nós não acreditamos que a fotografia tradicional vá morrer, principalmente se o mercado acelerar o ritmo de exposição aos consumidores da possibilidade de criar fotos digitais a partir de uma câmera tradicional. Nos EUA, nós já temos uma câmera de uso único que permite que você, na revelação, receba o negativo das fotos e o CD com a foto digital. Então nós acreditamos que as pessoas vão continuar tirando fotos da forma tradicional - e vão ficar ainda mais satisfeitas porque terão possibilidade de ter as fotos digitais. Além disso, a tendência é que a câmera e a impressão convencionais sejam sempre mais baratas do que as digitais.

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