Receitas




Salada de agrião e laranja

Consomê tia Adelaide

Sopa creme de agrião

Boeuf bourguinon

Pudim de macarrão

Macarrão em rodelas

Panquecas de cambert

Torta preguiçosa

Bolo de maçã

velhinhas


­ Cécile! Vi um homem de óculos na sua cozinha!

­ Não se preocupe, Corinne, é o novo doméstico.
Passe-me o chá, por favor.

Doméstico? Cécile tem cada idéia. Imagine! Contratar um homem para os serviços de casa. Está ficando gagá... O rapaz até que é bem-apessoado... digamos... bonitão.

­ Muito distinto o seu doméstico, Cécile...

­ É de uma família tradicional sul-americana, Corinne... Fazendeiros, você sabe... E muito bem-educado também...

Bem-educado coisa nenhuma, é um belo pedaço de mau caminho, isso sim! Se Cécile não fosse tão carola...

­ É brasileiro.

­ Oh! Um playboy brasileiro falido! Que charmand!

­ Não é um playboy, Corinne. Nem falido. Parece que era operador da Bolsa de Valores em São Paulo. E largou tudo. Você sabe como são os jovens... Passe-me as bolachas, por favor.

Um aristocrata rebelde! Me lembra Yves Montand em Um príncipe em Nova York... Fazendo-se passar por pobre para conquistar Marilyn Monroe... Quem nosso playboy brasileiro tentará conquistar? Cécile, certamente, não... Ah, Ah, Ah...

­ Também quero um playboy brasileiro em casa. Onde você o conseguiu?

­ Ele é mesmo ótimo, mas não faz faxina nem lava a roupa.

­ Oh, Cécile! Contratar como doméstico um rapaz que não lava nem faz faxina... não é nada esperto, querida!

­ Sim, mas em compensação o moço tem atributos especiais, você sabe... Passe-me a manteiga, por favor.

Mas o que ela quer dizer com "atributos especiais"? O rapaz é bonitão, sim, mas... Oh! Virgem Santíssima! Não pode ser. Cécile tem 80 anos! Ela não teria coragem... ou teria? Meu Deus! Eu sempre desconfiei. Por isso Cécile parece alegre demais para sua idade... Quem diria?

Devassa! E ainda posa de senhora respeitável, religiosa... É uma infâmia! Nem vou comentar nada. Não vou mesmo...

­ Na sua idade, Cécile?!

­ O quê?

­ "Atributos especiais"! Ora, Cécile, você devia se dar o respeito!

Oh! Não! Lá vem ele. O playboy brasileiro. Vem em minha direção. E com um sorriso de lascívia. Um avental amarrado na cintura, uma fôrma de bolo na mão e aquele sorriso. Ho, meu Deus! Tremo só de pensar... Ele me serve o bolo com maneiras delicadas... Mas a mim não engana, "monsieur atributos especiais"! Desavergonhado!

­ Experimente o bolo, senhora, é uma especialidade minha.

E ainda tem a audácia de me dirigir a palavra! Cínico! Aliciador de senhoras! Vou experimentar o bolo, sim. E depois me retiro sem demora deste antro. "Atributos especiais"... Pois sim! Mmmm... mas até que o bolo... Mmmm... não é nada mau... Mmmm... muito bom... Mmmm.. será que é a baunilha... Mmmm... não, talvez o... Mmmm... Mas de onde vem este gosto? Delicioso! Mmmm... Surpreendente que um playboy brasileiro possa... mas até que o moço... Mmmm... tem atributos espec... mas, espere... seriam estes os...?

­ Muito distinto o seu doméstico, Cécile querida.
No fim de 1980, criei coragem, me demiti, vendi o carro, juntei uns caraminguás e fui para Paris.Estava saturado do trabalho na Bolsa de Valores e incerto sobre o rumo a tomar. Logo que cheguei herdei do Zé, meu irmão, um emprego chez Madame Valery-Radot e sua filha Nicole, na Place de Mexique. O trabalho era simples, tipo preparar o almoço e deixar uma sopa pronta para o jantar. Ir ao mercado fazia parte das minhas tarefas e eu adorava ver a enorme variedade de queijos, frutas, legumes. Elas gostavam da minha comida, gostavam do pudim de macarrão e dos pratos gratinados. Nos fins de semana sempre tinha amigos para almoçar no meu micro apartamento na rue Duplex. Como meu orçamento era limitado só ia aos bons restaurantes quando algum tio ou amigo abastado passava por Paris. Aí sim eu tirava a barriga da miséria. Um ano depois, de volta a São Paulo, aproveitei o "espírito natalino" para começar a fazer patês.

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