charlô of course


Receitas

Pão caseiro

Salada de rúcula,
camarão e manga

Presunto de pato com
piclês de pêra

Picles de pêra

Torta de cebola e bacon

Kedgeree

Charlotte de damasco

Terrine de chocolate com amêndoas

Tart tatin

Sorvete com farofa de pistache

o manobrista


­Boa tarde, doutor! Tem alarme? Pode deixar, doutor, eu tomo cuidado.
Odeio carro com alarme. É a única coisa que me irrita no meu trabalho. O resto eu tiro de letra. Arrumo uma vaga legal, tomo conta, distraio o DSV...

­ Boa tarde, doutor!
Esse é gente fina. Vem aqui desde que a casa abriu. Acho que conheci todos os carros dele. Só carrão. Todos importados, freio ABS, cedê plêier, ér bags, essas coisas... Uma vez tive que descolar uma embalagem de emergência num boteco aí da esquina porque ele resolveu levar um pouco de bacalhau pra casa. Vê se pode...

­ Boa tarde, madame!

Esta também vive aqui. Coroa enxuta. Cada vez com um rapaz diferente. Ou ela tem um monte de filhos ou não sei não... Só sei que o carro da mulher cheira que é uma beleza...

Quando a rua tá cheia que nem hoje, eu tenho que ficar esperto. Sim, porque eu sou manobrista, mas tenho meus princípios. Carro em cima da calçada e fila dupla não tem vez na minha rua. Quer dizer, na rua do restaurante...

­Qual a placa, doutor?
Esse também tá levando comida pra casa. Pelo tamanho da embalagem deve ser uma salada. É, a casa agora tem embalagem própria. Escrito Charlô e tudo mais...

­ Brigado doutor!

Agora não preciso mais ir buscar no boteco da esquina. Boa idéia essa. Aquele loirão lá do conversível, por exemplo, vem aqui só pra buscar rosbife. Outro dia começou a chover e eu não sabia fechar aquela capota. Ainda bem que o rosbife já estava encomendado e ele saiu logo, senão eu ia passar vergonha. Sabe como é, manobrista que não sabe pra que lado fica a ré ou não consegue fechar uma capota não é manobrista, é guardador de carro...

­ Boa tarde, senhor doutor!

Esse aí é metido a besta que só ele. E o pior é que eu já vi daqui de fora que é a mulher quem paga a conta. E mesmo assim ele faz questão de levar pra casa uma torta salgada ou alguma sobremesa... Ele só paga quando vem com a outra. E, pra compensar, a outra sempre leva uma embalagem pra viagem. E põe na conta dele. Otário.

­ Boa tarde, madame! Quê? Se tem carne-seca? Peraí que eu vou lá dentro perguntar.

Só me faltava essa. A madame pára o carro no meio da rua e quer saber se dá pra levar carne-seca pra vinte pessoas. Carne-seca pra vinte só se for festa no Piauí!

­ Pode entrar, madame, tem sim.

Só quero ver se vai ter embalagem pra isso tudo. Senão vou ter que voltar a freqüentar o boteco da esquina...

­ Qual é a placa doutor?

Pelo tamanho da embalagem ele tá levando sobremesa. Tá ficando perigoso. Se continuarem a levar comida desse jeito não vai sobrar pra mim depois. E sem almoço eu vou pro sindicato! Tô avisando!

­ Tira a mão daí moleque, senão te quebro a cara!

Deixa eu ir lá dentro buscar a carne-seca pra vinte da madame... Eta porta-malas espaçoso! Assim que eu gosto, nada como um importado. Opa! Que quié isso? A madame tá levando a Zezé, nossa santa copeira e musa inspiradora das minhas melhores manobras! Tenha santa paciência! A Zezé tá indo junto com a carne-seca e a sobremesa! Que absurdo! A nega é minha e o que é meu não se divide!

­ Como? Pois não, madame... Se eu quero fazer um bico de manobrista?... Quando, madame?... Hoje à noite, madame... Claro, madame... É só me dar o endereço... Brigado, madame.... Até mais tarde, hein, Zezé!

Começamos a fazer saladas e alguns pratos que podiam ser levados para casa. Os clientes aprovaram e o movimento cresceu. Logo começamos a receber encomendas para festas e pedidos para cardapios especiais. Um belo dia uma freguesa perguntou se podiamos arrumar alguém para servir um jantar, outra pediu emprestado rechauds e assim por diante. Quando me dei conta era dono de um buffet.

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